São Paulo, domingo, 11 de setembro de 1994
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Palmeiras ganha charme ao perder titulares

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Qualquer time que perde três titulares –todos de seleção–, se não entra em pânico, no mínimo transmite uma baixa de expectativa. Pois o Palmeiras anda em tal fase que a perda de dois ou três titulares, por punição disciplinar, é até um charme. Por exemplo: as ausências hoje de Zinho e Roberto Carlos, contra o Inter, oferecem a chance de a gente entrar em contato com o futebol emergente de Paulo Isidoro e Wágner, que estréia na lateral-esquerda do Verdão.
Paulo Isidoro já vimos no Vitória da Bahia e até mesmo no Palestra. Joga fácil, esquivo e ao mesmo tempo rebuscado, liso, ágil, dissimulado. Gostaria de vê-lo numa formação de meio-campo com um só volante –César Sampaio, claro, que também não atua esta tarde.
Já Wágner, é de se ver. Esse menino, que veio do Juventus, andou –e bem– pela seleção brasileira de novos. Mas esse currículo, às vezes, é traiçoeiro.
Basta lembrar o caso de Daniel, que está no Corinthians. Quando ainda júnior do Inter, Daniel simplesmente voava pela lateral-esquerda da seleção até 23 anos. Canhoto, dono de chute forte, veloz, habilidoso, marcava e atacava com eficiência incomum. Mas, quando cresceu, se apequenou.
Que mistérios, que substâncias fluidas e imperceptíveis atuam sobre a formação de um jogador, que fazem do craque um cabeça-de-bagre e de um nítido perna-de-pau uma celebridade? Ah, se eu dominasse tais segredos...
Logo, tudo haverá de contribuir para que Wágner deslize pela lateral-esquerda de cuca fresca esta tarde, contra o Inter.

Por falar em jovens valores, o papo inevitavelmente conduz à demissão de Pelé. A demissão de Pelé, quem diria? Em que parte do mundo Pelé seria demitido de coisa alguma? Só na Vila, onde medra a vaidade e a intriga.
Pois o que queria o maior atleta do século que se finda? Apenas resgatar a velha e profícua política que fez do Santos o grande Santos, antes mesmo de Pelé.
Sim, porque quando o menino Gasolina desembarcou na Vila, vindo de Bauru, com 15 anos de idade, o Santos já era uma usina de craques.
Depois de amargar 20 anos de ostracismo, campeão pela última vez em 1935 –e mesmo assim com o futebol paulista cindido–, o Santos surpreendia a todos com uma equipe jovem; jogadores recolhidos na praia e nos aspirantes do Fluminense, do Madureira, do Vasco. E um argentino em fim de carreira, combativo e talentoso, Negri. Logo emendou o bi, já com Jair Rosa Pinto, no lugar de Negri, comandando uma safra de meninos semeados ali mesmo na Vila, como Del Vecchio, Pagão, Pepe e uma sucessão incrível de herdeiros, que vai de Joel Camargo a Clodoaldo, de Negreiros a Léo, de Nenê a Mazinho, esse que estava no Inter e voltou ao Bayern de Munique.
Só que, naqueles tempos, quem cuidava dos meninos era Ernesto Marques, um velho e paciente garimpeiro, que não deixou sucessores.
O que Pelé queria agora era sistematizar, metodizar, impessoalizar, enfim, essa produção, criando uma infra-estrutura para que a geração de craques na Vila fosse tão somente consequência natural do investimento básico.
Pura ilusão. Pelo jeito, o Santos terá de experimentar a água salobra do fundo do poço para renascer com a velha força.

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