São Paulo, quarta-feira, 14 de setembro de 1994
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Os custos políticos do desemprego

MAURICIO PULS
DA REDAÇÃO

Os principais candidatos ao governo federal priorizam, em seus programas, o crescimento econômico e a criação de empregos. Fernando Henrique promete investir R$ 75 bilhões para aquecer a economia e o PFL prevê a criação de 12 milhões de empregos; Lula acena com 8 milhões de empregos e um mercado de consumo de massa; os demais prosseguem nessa linha.
Essa prioridade não é casual: a recessão e o desemprego constituem fatores de desestabilização política, que podem até derrubar o governo. Eles reduzem a taxa de lucro e provocam a falência de milhares de unidades produtivas, levando parte do empresariado a retirar seu apoio ao presidente; já a redução dos salários e a queda do nível de emprego aumentam a impopularidade do Executivo junto aos trabalhadores.
Não é preciso ir muito longe para observar essa correlação. Há menos de dois anos, a Câmara aprovou o impeachment de Fernando Collor. Seu mandato foi pautado pelo neoliberalismo econômico. Em 1990, ano de sua posse, o Produto Interno Bruto per capita caiu 6,2%, e continuou declinando em 1991 (-0,8) e 1992 (-2,7). O nível de emprego despencou: -4,0 em 1990, -2,5 em 1991, -2,9 em 1992. A insatisfação com o governo engrossou a campanha pelo impeachment. Collor caiu em 29 de setembro.
Anos antes, o regime militar também tinha se esfacelado sob o impacto de uma recessão. O governo João Baptista Figueiredo adotou em 1981 uma forte política restritiva. O PIB per capita caiu 5,7% em 1981, 1,5% em 1982 e 2,7% em 1983. Nesse período, o PDS perdeu dez governos estaduais e a maioria na Câmara. Em 1984, o desemprego continuou aumentando até maio. A economia começou então a dar sinais de recuperação, mas o estrago já tinha sido feito. Em julho, o PDS rachou. Em agosto, a Frente Liberal fechou aliança com o PMDB, garantindo a vitória de Tancredo Neves em 1985.
Esse mesmo regime militar tinha surgido em meio a uma grave crise. O crescimento econômico da era JK vinha declinando. Em 1963, quando João Goulart recuperou os poderes de presidente, o PIB per capita caiu 2,2%. A recessão (que prosseguiu até 1965) estreitou a base política de Jango, deposto em março de 1964.
Jango era o herdeiro de Getúlio Vargas, e sua queda encerrou um ciclo iniciado pela Revolução de 1930. Ora, a própria revolução emergiu da crise econômica de 1929. Sob o impacto da recessão, o presidente Washington Luís tentou manter a todo custo o controle sobre o governo, rompendo o acordo com Minas Gerais. A divisão acabou conduzindo à disputa eleitoral, à guerra civil e à queda do presidente.
As crises derrubam presidentes e, por vezes, derrubam mais do que isso. A recessão e o desemprego solapam não só este ou aquele governo, mas o próprio sistema político. Os principais ciclos autoritários (Estado Novo, governos militares) surgiram quando o modelo de desenvolvimento do período precedente se esgotou.
É possível perceber que o aumento do desemprego resultante da última recessão fortaleceu os grupos de extrema-direita, cujas milícias são formadas por jovens que não encontram uma ocupação (Carecas do ABC, nazistas). Hoje eles já têm inclusive um candidato a presidente. À medida que o Estado democrático se mostra incapaz de assegurar a sobrevivência de uma parcela da população, esta também não vê qualquer problema em substituí-lo por um Estado intervencionista, capaz de garantir o pleno emprego.
A coluna ERA UMA VEZ é publicada às quartas-feiras

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