São Paulo, quarta-feira, 14 de setembro de 1994
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Corman organiza sua temporada no inferno

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

"Orgia da Morte" é o melhor filme da série de adaptações feitas por Roger Corman sobre textos de Edgar Allan Poe. Em si, isso não significa grande coisa. Aliás, mais vale esquecer dos originais, quando se vê esta série.
O que conta, aqui, é a operação cinematográfica de Corman. Já no "travelling" de abertura, que termina com o encontro entre uma velhinha e a morte vermelha, o clima está dado: é o fantástico em pleno andamento, no sentido de uma arte que desperta os nossos mais caros, dolorosos e ocultos fantasmas.
O que virá a seguir confirma essa opção. Do rosto depravado do príncipe Prospero (Vincent Price), à cor vermelha que domina seus salões, Corman nos convida a uma temporada no inferno.
E cada um escolhe seu inferno. O de Prospero é constituído de um misto de temor e admiração pela morte. Isso o leva a se julgar a salvo da Peste Negra, no interior do castelo. Isso o leva também a fazer da perversão uma espécie de esporte.
Prospero tanto pode transformar seus aldeões em gladiadores (e jogá-los em lutas mortais) como aviltar seus amigos (os que pretendem se safar da peste escondendo-se no castelo).
O importante, no caso, é que cada um dos momentos é levado com uma energia criativa admirável: cena a cena, o filme inventa uma situação nova, de modo a se colocar no limite entre o fantástico e o horror.
Com isso, "Orgia da Morte" tira as defesas do espectador. Ao mesmo tempo, mostra e sugere, expõe os fatos e nos faz tirar deles uma decorrência. Coloca o espectador em dois registros simultâneos, que no entanto se deixam distinguir como num trabalho cirúrgico: o das idéias e o das sensações.
Estamos, aqui, no registro do melhor Corman. Como em "Eu Te Odeio", em que trata de um príncipe Prospero moderno (isto é, um homem que levanta os brancos de uma cidadezinha do Sul contra a integração racial nas escolas), o homem é um ser sujeito à perversão, que constrói o inferno dos outros e o seu próprio.
Os filmes de Corman estão sendo exibidos sem legendas. Nada, em todo caso, que uma boa sinopse não resolva. Hoje completam a programação "A Pequena Loja dos Horrores" (20h) e "Ano 2000 - A Corrida da Morte" (22h).
Filme: Orgia da Morte
Produção: EUA, 1964, 86 min.
Direção: Roger Corman
Elenco: Vincent Price, Hazel Court
Onde: hoje, às 18h, na Sala Cinemateca (r. Fradique Coutinho, 361, tel. 011/881-6542); em V.O. sem legendas

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