São Paulo, sexta-feira, 23 de setembro de 1994 |
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A ditadura da ignorância
GILBERTO DIMENSTEIN BRASÍLIA - Já escrevi nesta coluna que o artigo de Luiz Inácio Lula da Silva à revista espanhola "Câmbio 16" mistura leviandades, exageros e mentiras. E, pior, exala golpismo. Mas, por outros motivos, concordo que o processo eleitoral brasileiro tem uma dose de ilegitimidade.Absurdo falar que as eleições não são limpas: aqui e ali, existem simpatias na imprensa. Mas está livre e produzindo investigações incômodas contra Fernando Henrique Cardoso; o Judiciário não está amordaçado; não se fecharam as tribunas do Congresso. O problema –e daí a dose de ilegitimidade– é que a democracia e o processo eleitoral sofrem com a ditadura da ignorância. Ou seja: uma imensa fatia dos cidadãos é analfabeta ou semi-analfabeta, devido ao colapso educacional brasileiro. Isso significa que milhões de eleitores não acompanham com o devido poder crítico as propostas de governo, debatendo sua viabilidade, apontando alternativas. Um problema que se agrava porque a maioria dos candidatos trata as eleições apenas como um show de ilusionismo: não expõe idéias, apenas imagens. A catástrofe educacional gera um campo fértil para a mentira. Dificulta que, depois, se acompanhem e se cobrem as promessas feitas em palanque. Está aí o grande desafio da nação: aumentar a taxa de democracia significa, na prática, aumentar a taxa de educação. Sem isso, o conceito essencial de transparência torna-se uma abstração. Não entendem direito o que vêem ou lêem –o que, claro, reduz as vantagens da liberdade de imprensa, por exemplo. Vamos reconhecer: a tarefa de construir uma nação torna-se mais árdua quando, de um lado, há milhões de seres humanos condenados a viver na ignorância. E, de outro, uma ampla parte da elite política "educada" que se sustenta na ignorância. Mas não há alternativa fora da democracia. Votar é aprender com acertos e erros: a legitimidade da eleição repousa, em grande parte, no aprendizado desse processo. Texto Anterior: CARDÁPIO; ALFINETADA; EUTANÁSIA Próximo Texto: A utopia da 202 Norte Índice |
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