São Paulo, domingo, 1 de janeiro de 1995
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Justiça em Crise

ALMIR PAZZIANOTTO PINTO

"Não fomos capazes de desenvolver mecanismos minimamente eficientes de conciliação e arbitragem"

Mostram as estatísticas da Justiça do Trabalho que, de 1983 a 1994 (até o mês de junho), deram entrada nas Juntas de Conciliação e Julgamento 12.635.496 reclamações trabalhistas ajuizadas por um ou mais de um reclamante, ou pelos sindicatos de trabalhadores investidos no papel de substitutos processuais.
Em grande parte são processos de interesse de ex-empregados julgando-se credores de diferenças salariais, ou de outros direitos não liquidados por ocasião da rescisão contratual.
Imaginemos cada uma dessas reclamações a exigir, em média, dez horas de dedicação exclusiva das partes, advogados, juízes de várias instâncias, testemunhas, peritos, funcionários, nada menos do que 126.354.960 horas seriam consumidas para se concluir se as dívidas reivindicadas existem, e serão ou não pagas.
Esse dispêndio de tempo, mão-de-obra, dinheiro e energia ocorre porque não fomos capazes de desenvolver técnicas e mecanismos minimamente eficientes de conciliação e arbitragem, que funcionariam junto às empresas e sindicatos visando permitir que se convertessem em processos unicamente aqueles casos que, pela sua complexidade, merecessem apreciação da Justiça especializada.
Creio ser axiomático que, quanto maior o número de ações em andamento, menor o tempo disponível dos juízes para cada uma delas e, por contraditório que possa parecer, maior a demora registrada para que decisões definitivas sejam tomadas e cumpridas.
Também é verdadeiro que, ao se multiplicarem os órgãos de decisão mais variadas e entrechocantes serão as interpretações acerca dos mesmos temas jurídicos.
Buscando acompanhar essa brutal elevação de volume de serviço, a Justiça do Trabalho tem solicitado ao Executivo e ao Legislativo a criação de mais juntas, a ampliação dos tribunais regionais do trabalho, e a nomeação dos juízes e funcionários destinados a colocá-las em funcionamento.
Nada disso, porém, resolverá a crise em que se debate o Judiciário Trabalhista se medidas deixarem de ser adotadas com o salutar propósito de reduzir a quantidade de processos. Nesse sentido, aos empresários e aos sindicatos de trabalhadores incumbe, em nome do interesse nacional, realizar incessante esforço para liquidação, mediante acordo, do maior número das demandas em andamento.
Por outro lado, se conseguíssemos fazer com que, de cada dez reclamações embrionárias cinco fossem solucionadas diretamente pelas partes, e das outras cinco, pelo menos três findassem antes da audiência de instrução, a atual capacidade produtiva do Judiciário trabalhista seria multiplicada, sem a obrigatoriedade de instalação de novas juntas, ou da ampliação da capacidade de trabalho dos tribunais.
Ostentamos o comprometedor título de "campeões mundiais de processos trabalhistas", indesejável quando urge retomar o processo de crescimento econômico, interrompido há anos.
As incertezas e a insegurança características das relações de trabalho no Brasil converteram-se em fortes obstáculos para os investidores externos, habituados a administrarem recursos humanos sob princípios racionais e modernos, diferentes daqueles que temos tradicionalmente obedecido, e que fazem do conflito permanente, entre patrões e empregados, uma espécie de estilo de vida.

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