São Paulo, domingo, 1 de janeiro de 1995
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OS MELHORES ANOS DE NOSSAS VIDAS

ABL E PD
DA REPORTAGEM LOCAL

Pessoas que tiveram vidas mais do que excitantes, como Sophia Loren e Caetano Veloso, elegeram como o melhor de suas vidas momentos que acontecem com quase todo mundo: o nascimento dos filhos.
A reprodução da espécie ficou em primeiro lugar na enquete, tendo sido citada por 12 entrevistados. Para Desmond Morris, 66, biólogo inglês, autor do best-seller "O macaco nu", o medo da morte explica o apego à maternidade. "Instintivamente, através das crianças, nos sentimos estranhamente imortais. Isso dá um prazer muito grande", disse Morris à Folha, por telefone, de Oxford.
Para os que aclamaram que o próprio nascimento foi o melhor momento de suas vidas, restou uma análise desanimadora. A psicanalista junguiana Denise Gimenez Ramos, 45, professora da PUC-SP, acredita que essas pessoas são essencialmente narcisistas. "É como se pensassem: 'Eu nasci e o mundo todo mudou"', interpreta Denise.
Segundo a professora, esses ilustres se sentem tão importantes que seu próprio nascimento é capaz de superar qualquer outro de seus grandes feitos.
Já quem não consegue apontar um ano especial –ou porque todos são ruins ou maravilhosos demais– foi tachado de "estranho" por Morris."É surpreendente esse tipo de resposta e muito triste também. Isso significa uma vida linear, de conquistas ou fracassos sucessivos", acredita o biólogo.
Falta de criatividade foi a explicação dada por Denise para quem não teve nada a dizer. "São pessoas que passam a vida em brancas nuvens e não percebem o que acontece com elas. Se está tudo igual, é porque não estão vendo absolutamente nada", diz.
A psicanalista Mirian Chnaiderman não concorda. Para ela, não existe um ano especial porque as pessoas "constroem as coisas no dia-a-dia". Mirian condena a idéia de um período marcante no passado. "Acho complicado viver nostálgico o resto da vida. É como se a alegria de viver tivesse ficado para trás", afirma.
A infância, endeusada na literatura e no cinema como a fase melhor e mais pura, foi esquecida por quase todos. Para Morris, isso acontece porque ninguém se lembra dos tempos de criança.
"Meu filho, aos 4 anos, teve o melhor ano de sua vida. Morávamos perto do mar, tínhamos um barco, ele ia à praia todos os dias. A vida não podia ser mais perfeita para um garotinho. Eu digo isso a ele hoje (ele tem 26 anos), mas ele me responde que simplesmente não se lembra", conta Morris.
O biólogo, que escreveu um livro sobre as idades, acredita que os 18 anos são o ápice do desempenho sexual masculino. Para as mulheres, só aos 36 anos. A criatividade pelo menos coincide: ambos chegam ao apogeu aos 38 anos.
O conselho, portanto, para quem for participar da enquete é tentar fazer um balanço geral. E não se apegar "apenas" aos sucessos mais recentes, como fizeram o jogador de futebol Zinho e o presidente Fernando Henrique Cardoso.

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