São Paulo, domingo, 1 de janeiro de 1995
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Frágeis costuras do Real

MARCOS CINTRA

Diferentemente do que se imagina, o Brasil corre risco de estar na mesma trajetória do México. É evidente que o Brasil não acumulou déficit comercial de US$ 18 bilhões; e nem perdeu três quartas partes de suas reservas, que naquele país caíram em alguns dias de US$ 24 bilhões para US$ 6,5 bilhões. O risco não é imediato.
México, Argentina e Brasil avançaram na estabilização ancorados no câmbio. Mas esqueceram dos fundamentos da estabilidade econômica, ao não complementarem a política cambial com mudanças no regime monetário e fiscal.
A fixação do câmbio é uma medida de curto prazo. Os preços internos caem. Os importados abundam. O PIB e o poder aquisitivo aumentam. Produtos sofisticados surgem nos mercados de consumo e de bens de capital.
Some-se a isto o fato do governo brasileiro ter controlado o componente inercial da inflação. Resultado: aumento de preços de 2% ao mês. Com aumento de demanda e emprego.
Alguém paga por isto? Os lucros e salários dos setores de bens comercializáveis –exportadores e setores que competem com os importados.
Os problemas, no entanto, começam a aparecer. Pelo segundo mês consecutivo haverá déficit comercial de cerca de US$ 250 milhões. O fluxo financeiro também será negativo e já em dezembro haverá perda de reservas.
Trata-se de desajuste estrutural, que resultará, se correções não forem feitas, em experiências dolorosas, como no México e na Argentina.
As correções implicam reformas, dentre elas a tributária, a administrativa, a previdenciária. Com isto se estaria transferindo o custo do ajuste para os que se locupletam com a corrupção e com os privilégios do setor público.
Âncoras cambiais são instrumentos limitados em economias com baixo coeficiente de abertura. A inflação nos setores não-comercializáveis e nos serviços já corre solta, entre 5% e 10% ao mês em dezembro. Se nada for feito, a frágil âncora cambial será logo arrastada pelas correntezas estruturais da economia brasileira.

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