São Paulo, domingo, 1 de janeiro de 1995
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Por um ano mais moleque

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – Para servir de mensagem de Ano Novo, retiro do baú dos guardados poema de Jorge Luís Borges, enviado pelo eterno moleque travesso Carlito Maia, junto com tantos outros escritos. O mesmo poema foi o tema do cartão de Natal do sindicalista Luiz Antônio Medeiros.
Serve para o leitor, mas gostaria que, pelo menos desta vez, também o presidente da República lesse o recado.
Nesse mundo de bom-mocismo, de tentar agradar a todos, os amigos de sempre junto com os adversários da véspera e também os de amanhã, parece se estar perdendo a capacidade de ousar, de inventar ou de chutar o pau da barraca, para servir de contraponto ao tratamento castiço que Borges dá ao idioma.
Uso Borges nem tanto por uma particular paixão pelo notável escritor argentino. Mas porque todo o mundo sabe que não se trata de um revolucionário ou um esquerdista, essas categorias caídas em desuso no mundo do bom-mocismo. Era um reacionário assumido e tudo leva a crer que os reacionários são, hoje, mais ouvidos do que nunca.
Escreve Borges: "Se pudesse viver novamente minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. (...) Correria mais riscos, faria mais viagens, contemplaria mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios".
Continua o poema: "Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem ter um termômetro, uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas. Se voltasse a viver, viajaria mais leve. Começaria a andar descalço no começo da primavera e continuaria assim até o fim do outono".
Se, como é mais provável, o presidente não ler ou der de ombros, fique o leitor com Bakunin, o anarquista: "Sou um partidário convicto da igualdade econômica e social, porque sei que, fora dessa igualdade, a liberdade, a justiça, a dignidade humana, a moralidade e o bem-estar dos indivíduos, assim como a prosperidade das nações, serão nada mais do que mentiras".

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