São Paulo, segunda-feira, 2 de janeiro de 1995 |
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'Ópera Mundi' faz espetáculo da criação
MARIO VITOR SANTOS
Seu maior mérito cênico foi preencher toda a arena –no chão, nas estruturas, mas principalmente no ar, até acima das marquises –com objetos colossais, adereços voadores de dimensões fenomenais e atores-trapezistas que executam evoluções de deixar qualquer um na ponta dos pés. A história descreve a evolução do mundo, desde o Big Bang até a utopia futura. O principal elemento cenográfico, por assim dizer, é uma enorme torre –misto de módulo lunar, usina, árvore, farol, vulcão, navio, canhão, totem e falo– montada no centro do gramado. Dela, na cena inicial do Big Bang, aparecem dezenas de ciclistas expelindo faíscas, astros incandescentes em dispersão no palco, que é um grande tablado assentado sobre a grama em quase toda a extensão do campo. O fogo é o elemento mais importante. Surgem o sol e a lua. Presos por cordas a dois enormes balões, dois atores do grupo espanhol Comediants realizam um balé alado ao longo de todo o "espaço aéreo". Ao meu lado, um menino, com jeito de Stephen Hawking e sandália Rider, boquiaberto, aplaude. Segue-se a criação da vida. Vêem-se colunas verticais de atores, que vão desde os primeiros degraus da arquibancada até a marquise. Eles estão presos a cordas na perpendicular, uns trepados nos ombros dos outros, envoltos em enormes casulos de tecido branco que se contorcem. Sobre eles jorra da marquise uma cascata dourada. O conjunto, iluminado por trás, forma cadeias de DNA. Enquanto isso, a atriz Cristiane Torloni, espécie de monja parabólica no alto da torre central, apresenta o espetáculo, faz supostas conexões por satélite. Cientistas falam de diversas partes do mundo. Expõem teorias sobre a origem do universo, da vida, da espécie humana. No gramado, uma mistura de onça e centopéia come pequenos seres que são salvos pelo gigantesco "El Corredor", escultura móvel de aço representando um homem que corre no anel das gerais e cuja cabeça alçança a altura das arquibancadas. Ele traz Zico, que chuta uma bola na boca da onçapéia e liberta os serezinhos. É piegas, mas funciona. Depois de uma cena de sofrimento, descoberta e morte, macacos ficam de pé. Surge a espécie humana. Aí o espetáculo perde ritmo. Parece difícil preencher o espaço enorme do gramado com apenas três ou quatro dezenas de atores. Só com muito boa vontade é possível entender, com ajuda da trilha sonora, que o mundo representado se diferencia cada vez mais, que as diversas culturas são impenetráveis. A unidade retorna com o tema da superpopulação e da guerra, uma apoteose pirotécnica de tirar o fôlego. No final, espécies de pégasos a jato, descem do céu de paragliders sobre o estádio. A última conexão é com Tom Jobim. Um coral canta o "Samba do Avião". Apesar do happy-end não explicar muito bem como ocorre o milagre da interpenetração das culturas e do entendimento entre os povos, apesar de ter sido suprimida a prometida e inédita apresentação conjunta dos milhares de ritmistas de todas as escolas de samba, apesar do atraso da apoteose de fogos no final (só iniciada quando a platéia estava fora do estádio), "Opera Mundi" tem eficiência dramática e oferece momentos de deslumbramento único. Quem perdeu, terá que esperar por prometido evento mundial na virada do milênio. Foi só um ensaio. Texto Anterior: Atlanta reúne nove premiados com o Nobel Próximo Texto: Cinemateca exibe filmes sobre pintura Índice |
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