São Paulo, segunda-feira, 9 de janeiro de 1995
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Os novos revolucionários

Josias de Souza
BRASÍLIA – Desconfio de todo presidente que assume prometendo uma revolução. O verdadeiro espírito revolucionário não promete. Simplesmente revoluciona.
De resto, governo é sempre governo. Por melhor que seja, convém tratá-lo com reservas. Costumo dizer que governo é como remédio. A bula sempre realça mais as virtudes do que os efeitos colaterais.
Fernando Henrique prometeu, já na posse, uma revolução contra a miséria. Entre os poderosos e os desvalidos, ficaria sempre com os segundos.
Há um defeito de origem na declaração de propósitos de Fernando Henrique. Na verdade, o novo presidente já fizera sua opção. Na campanha, aliou-se aos aliados da miséria.
A primeira semana bastou para que se verificasse a maior contradição do novo governo. Os inimigos de Fernando Henrique não estão na oposição. Frequentam o Palácio do Planalto.
Seus adversários exigem não o fim da miséria, mas a aprovação da anistia a Humberto Lucena. Antes do combate à fome, cobram do presidente que mate o seu apetite por cargos. Não querem os postos para servir. Desejam servir-se.
O novo governo não é nem mesmo original. Ontem, os "aliados" de Fernando Henrique deram suporte ao "tudo pelo social" de José Sarney. Apoiaram em seguida a administração de Fernando Collor, voltada para os "descamisados e pés descalços".
Fernando Henrique costuma dizer que uma "mão invisível" sempre o ajudou em sua vida pública. De fato, chegou à Presidência sem grande esforço.
Há um ano, transitaria pela avenida Paulista sem que lhe dirigissem um cordial "bom dia". Ainda assim, superou Brizola, que persegue o Planalto desde os tempos em que sorvia mamadeira. Bateu Lula, outro presidenciável profissional.
É até possível que Fernando Henrique revolucione o país. Mas, antes, terá de revolucionar a cabeça de seus aliados. A sorte não lhe bastará. Não acredito em sucesso sem úlcera. Agora, não há mão invisível que substitua o suor.

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