São Paulo, quarta-feira, 18 de janeiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Cinemateca da Índia luta para preservar produção gigantesca

LÚCIA NAGIB
ENVIADA ESPECIAL A BOMBAIM

P.K. Nair, fundador da Cinemateca Nacional da Índia e memória viva do cinema indiano, corrige a cifra normalmente divulgada: não são 700, mas cerca de 900 filmes produzidos anualmente no país. Como proteger essa produção gigantesca do desaparecimento?
É esta questão que vem ocupando Nair há mais de 30 anos, desde que fundou a Cinemateca da Índia em 1964. Não fosse seu trabalho obstinado –comparável ao de Henri Langlois, na França, ou de Paulo Emilio Salles Gomes, no Brasil–, não haveria mais meios hoje de se ver a produção indiana do período silencioso e início do sonoro. São, no entanto, belos filmes, com uma riqueza de estilos e gêneros comparável às melhores cinematografias do mundo.
Esses filmes antigos, ao lado da produção contemporânea, poderão em breve ser vistos no Brasil numa mostra que Nair está ajudando a organizar, junto com entidades brasileiras.

Folha - Malti Sahai, diretora do festival, afirmou que 50% dos filmes indianos em nitrato estão destruídos.
P.K. Nair - A perda é maior: cerca de 75% dos filmes anteriores a 1950, isto é, do período do nitrato, se desapareceram por completo. Ninguém cuidou deles. E os cineastas não tinham o equipamento, o know-how técnico ou a base econômica para se ocupar disso. Estavam preocupados com filmar.
Folha - Como foi que a Cinemateca Nacional da Índia interferiu nesse processo?
Nair - Entramos em cena quando o cinema já tinha mais de 50 anos. Em 1913 foi projetado publicamente o primeiro filme indiano, e nós começamos a coletar material sistematicamente em 1964. Naquela época, a maioria dos filmes antigos tinha desaparecido, especialmente do período silencioso.
Folha - Qual a relação da Cinemateca com os produtores de filmes? Há algum acordo para depósito de cópias?
Nair - Não há qualquer acordo de depósito legalmente estabelecido. Não é possível guardar uma cópia de cada filme, nem que se queira. Quando começamos o arquivamento, demos prioridade para os filmes antigos em nitrato.
Hoje os produtores estão conscientizados da importância de preservar seus negativos, mas nós não temos espaço para todos eles. Minha postura foi, evidentemente, diferente com relação aos filmes antigos: recolhi tudo que pude encontrar.
Folha - Essa era também a filosofia de Henri Langlois. Qual foi o contato de sua cinemateca com a francesa?
Nair - Tivemos um contato muito bom, desde o início. Em 1968, organizamos uma grande mostra de filmes indianos em Paris, enviamos a eles cerca de 70 títulos.
Langlois tinha esse interesse por cinematografias de países em desenvolvimento. Até então, com exceção de Satyajit Ray, o cinema indiano não era conhecido na Europa. Foi essa mostra na Cinemateca Francesa que deu início à divulgação do cinema indiano no exterior. Com isso, muito filmes e cineastas foram "descobertos" no Ocidente, como Guru Dutt, Raj Kapoor (que já era conhecido no bloco oriental e na China).
Muitas mostras se seguiram no mundo inteiro. A única parte do mundo que ainda não atingimos, exceto por obras isoladas, é a América Latina. Estamos ansiosos pelo projeto da retrospectiva indiana no Brasil.

Texto Anterior: Lisboa expõe múltiplas visões do Brasil
Próximo Texto: Minissérie usará efeitos de 'Forrest Gump'
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.