São Paulo, domingo, 22 de janeiro de 1995
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Apenas 15 pessoas têm acesso a finanças

XICO SÁ; CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo de São Paulo limita o conhecimento da movimentação financeira do Estado a um grupo de apenas 15 pessoas.
Nem mesmo o Tribunal de Contas do Estado e a Assembléia Legislativa, responsáveis pelo acompanhamento e fiscalização dos gastos, têm acesso no dia-a-dia ao que acontece com as finanças.
No governo federal os números são acessíveis a cerca de 1.500 pessoas, que podem acompanhar a contabilidade por intermédio do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira) (leia reportagem nesta página).
Em razão da falta de transparência na divulgação das contas do Estado, o contribuinte foi submetido nas últimas semanas a uma complicada guerra de números entre as equipes do ex-governador Luiz Antonio Fleury Filho e a do atual, Mário Covas.
Na semana em que tomou posse, por exemplo, a equipe de Covas divulgava que haveria arrecadação de apenas R$ 340 milhões de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) nos seis primeiros dias de governo.
Os assessores de Fleury divulgavam outros números: R$ 600 milhões, ou seja, R$ 100 milhões a cada dia.
Ambos não revelaram de onde tiraram os números anunciados nem a população ficou sabendo, até agora, quem tinha razão.
A Folha tentou, durante as duas últimas semanas, saber a fonte de todas as contas apresentadas pela equipe de Covas e acompanhar a movimentação financeira do Estado no seu dia-a-dia.
A reportagem esbarrou na resistência do secretário da Fazenda, Yoshiaki Nakano. Ele informou, por intermédio de sua assessoria, que o assunto não era fundamental, pois havia outras tarefas mais importantes a realizar.
Informou também que estava reorganizando toda a contabilidade para evitar cometer equívocos ou iniciar novas polêmicas.
A equipe privilegiada com o acesso aos números do Estado é formada pelo secretário da Fazenda e 14 assessores do segundo escalão da Fazenda: técnicos da Cafi (Coordenadoria da Área Financeira) e da CCP (Coordenadoria de Crédito e Patrimônio).
Eles têm conhecimento, via computador, da arrecadação e de todos os gastos da máquina do governo estadual.

Via-crúcis
Os atuais 84 deputados estaduais enfrentam uma verdadeira via-crúcis para ter acesso a dados sobre a movimentação financeira dos cofres públicos e sobre projetos em andamento no Estado.
Não existem, na Assembléia, computadores ligados ao Executivo. Quando querem uma informação, os deputados têm que enviar um requerimento ao órgão correspondente, que tem prazo de 30 dias para dar resposta.
Nem sempre os deputados obtêm o que esperam. "Desde 1990 eu vinha tentando saber o número de funcionários do Baneser e o valor gasto com seus salários. Recebia sempre respostas evasivas", exemplifica o deputado Lucas Buzzatto (PT).
O tucano Ricardo Trípoli tentou em vão saber os critérios adotados pelo governo para definir o grau de despoluição do rio Tietê. Nunca obteve resposta satisfatória.
Embora esteja localizado na frente do prédio da Secretaria da Fazenda, a distância entre o TCE e os números do Estado é semelhante à situação enfrentada pela Assembléia.
Os conselheiros e os auditores do tribunal recebem apenas um relatório por escrito, no final de cada mês, com um resumo da movimentação dos recursos do Estado.
Somente a partir disso, podem fiscalizar o dinheiro que entra e o que sai dos cofres da Fazenda.
"Pedimos, pelo menos há dez anos, um serviço de linha direta com a Fazenda", afirma o conselheiro do TCE Roque Citadini. "Da forma atual a fiscalização fica muito limitada."
No final do ano passado, a Assembléia enfrentou uma situação paradoxal no capítulo de acesso a informações. Os deputados aprovaram um projeto que permitia a ligação, através de computador, entre a Assembléia e o TCE.
O ex-governador Fleury vetou o projeto sob o argumento de que o acesso dos deputados ao andamento dos processos no TCE constituiria "indevida ingerência" da Assembléia naquele tribunal.
Ao dar o veto, Fleury ignorou a disposição constitucional segundo a qual os tribunais de contas são órgãos auxiliares do Poder Legislativo na função de fiscalização dos órgãos da administração.
(Xico Sá e Cláudia Trevisan)

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