São Paulo, domingo, 22 de janeiro de 1995
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Forma de preensão separa hominídeos

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há mais ou menos 2 milhões de anos, existiam na África pelo menos duas, ou talvez mais, espécies de hominídeos. Elas, com todos os hominídeos daquela época, usavam implementos de pedra ou osso. Mas a questão que intriga os paleoantropologistas é descobrir quais dessas espécies do Plio-Pleistoceno usavam e trabalhavam esses implementos.
Randall L. Susman publicou em "Science" (265, 5378, 1570) um teste simples e elegante que permite resolver o problema.
Datam de 2,5 a 2,7 milhões de anos os instrumentos da chamada "indústria" do Oldowan, cujos uso e produção foram atribuídos ao Homo habilis.
Assim, todo Homo passou a ser considerado fabricante de instrumentos (por exemplo, machados de osso ou pedra), associada essa capacidade ao grande tamanho do cérebro.
Dessa capacidade foram sumariamente eliminados os australopitecíneos, os predecessores do Homo. Em seu trabalho Susman comparou mãos de primatas fósseis e atuais e observou em particular o ato de agarrar coisas. Nesse aspecto distinguem-se logo duas maneiras de comportamento, o agarrar simples, de força, como o dos macacos em sua vida arbórea, e o de precisão, como aqueles que envolvem operações delicadas, por exemplo as necessárias a fabricar e usar instrumentos.
O teste imaginado por Susman consiste na aplicação de força pelo polegar. Os hominídeos primitivos dotados dessa capacidade têm o primeiro metacarpiano (polegar) caracterizado pela robustez e por uma superfície articular (cabeça) larga que reflete aliás o reforço de sua musculatura. Outros elementos fazem parte do teste, remotamente inspirado aliás em observações de J.R. Napier.
As mãos dos antropóides (os grandes macacos) têm dedos longos e curvos com ponta fina e polegares diminutos. As humanas e as dos nossos mais adiantados ancestrais hominídeos têm dedos relativamente curtos e retos, com pontas largas e polegar longo e robusto, de ponta carnosa.
Essa diferença marca a passagem da preensão simples –o agarramento de pressão– para a preensão precisa como a da mão humana.
Tais diferenças anatômicas permitem que o homem e seus antepassados hominídeos imediatos tornem côncava a palma da mão, como concha. De posse do conhecimento da morfologia dos polegares ligados à preensão precisa, torna-se possível detectar a capacidade para esse tipo preensivo e a fabricação de instrumentos nas espécies fósseis do Plio-Pleistoceno (era quaternária) representados por metacarpos especializados do polegar.
O teste proposto por Susman baseia-se num único elemento do polegar, que tem a vantagem de ser bem representada o registro fóssil, o que evita algumas dificuldades observadas, por exemplo, nas normas de Napier. Pela aplicação do novo teste será possível resolver a dúvida existente sobre quais os hominídeos do Plio-Pleistoceno que usaram os instrumentos que compõem o complexo industrial de Oldowan há cerca de 2 milhões de anos. Parece certo que os primeiro australopitecíneos que precederam o aparecimento dos instrumentos de pedra não mostram indícios da preensão avançada de precisão.

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