São Paulo, domingo, 1 de outubro de 1995
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Melhor da cozinha de NY vem ao Brasil

JOSIMAR MELO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O chef Claude Troisgros, herdeiro de uma das mais nobres estirpes da cozinha francesa, volta ao Brasil.
Morando em NY, onde em maio de 1994 abriu o restaurante C.T., Troisgros vem ao Rio para implantar um novo cardápio no restaurante que leva seu nome, um dos melhores do país.
Mas o chef não vem sozinho. Além da mulher (Marlene) e dos filhos adolescentes (Tomás e Carolina), todos brasileiros, ele traz a tiracolo dois dos mais famosos chefs de NY: Daniel Boulud, ex-Le Cirque e proprietário e chef do Daniel, um dos melhores do mundo; e Charles Palmer, do prestigiado Aureole.
Eles preparam a seis mãos -mais duas dezenas dos melhores chefs do Brasil- um jantar beneficente (Le Grand DŒner) no hotel Copacabana Palace, do Rio, no próximo dia 10 de outubro.
Um encontro epicurista, com três pratos e três sobremesas, aberto com champanhe francês e concluído com charutos cubanos. O jantar custa R$ 280,00 e será em benefício da Cruzada do Menor (reservas e mais informações pelo tel. 021/286-1358).
Claude chegou ao Brasil em 79. Trazia o peso do nome Troisgros, família de restaurateurs que há três gerações pontifica, com notas máximas dos guias a cidade de Roanne, na Borgonha.
Ele veio trabalhar no Le Pré Catelan no Rio, indicado pelo chef francês Gaston lenôtre. Em seguida abriu uma casa em Búzios, depois no Rio, outra em São Paulo. Três anos atrás, voltou para Roanne, que lhe pareceu pequena demais.
Em poucos meses partia para NY, onde hoje faz em seu C.T. uma cozinha francesa enriquecida com ingredientes brasileiros -já que o Brasil para ele "é hoje mais meu país que a França".
Claude não tem mais medo de ser tragado pela voraz cidade, onde restaurantes pulam da rápida glória ao ostracismo num piscar de olhos, disse ele à Folha, de Nova York. ``Se fosse apenas uma moda, o restaurante fecharia em seis meses". O C.T. já dura mais de um ano.

Folha - Qual é seu balanço deste primeiro ano em NY?
Claude Troisgros - Foi uma grande oportunidade profissional. Constatei que é realmente aqui que tudo acontece; é o único lugar do mundo onde eu posso fazer o que eu faço hoje, um casamento das técnicas francesas com produtos da América Latina. Os americanos aceitaram bem.
Folha - O que mudou no restaurante depois de um ano?
Troisgros - Fizemos uma reforma para mudar o ambiente. Diminuímos de 130 para 95 lugares. O C.T. tinha a cara de um café informal, com o bar bem no meio. Agora o bar fica na entrada, e o restaurante ficou menor e mais sofisticado, inclusive na cozinha. Uso produtos mais sofisticados -trufas, foie-gras- e ampliei a carta de vinhos, com marcas da Califórnia, Bordeaux dos anos 70, Bourgognes dos 80.
Folha - Você teme a extrema rotatividade que é característica de NY?
Troisgros - Embora fique atento, não temo. Primeiro porque faço um trabalho que tem uma base gastronômica. Segundo, porque o restaurante já passou a fase de modismo. Se fosse apenas moda, ele fecharia em seis meses. Hoje já tenho uma clientela. Em terceiro lugar, porque o C.T. foi muito elogiado e badalado na imprensa e atraiu clientes de fora da cidade e do país através de jornais como ``The New York Times". Já não dependo mais só do cliente daqui.
Folha - Foi difícil entrar no círculo dos grandes chefes de NY?
Troisgros - Tinha medo de encontrar resistências, mas fiquei espantado com a receptividade dos colegas. Na Europa, os chefs são praticamente inimigos entre si. Aqui fui perguntando tudo -onde encontrar ingredientes, funcionários. Foram todos muito abertos. Hoje participo de todos os eventos que reúnem os grandes chefs.
Folha - Qual a tendência atual dos restaurantes de NY?
Troisgros - A moda agora é o que eles chamam de "fusion cuisine", a fusão de cozinhas diversas. Lembra um pouco a nouvelle cuisine francesa dos anos 80, uma mistura indiscriminada de tudo, sem muita base. Hoje isto é até mais fácil, pois se encontra todo tipo de produto, principalmente os orientais, antes mais raros. Isto deve durar uns dois ou três anos, depois só restarão os melhores.
Folha - O seu restaurante, que usa ingredientes brasileiros sobre uma base francesa, não estaria incluído nesta tendência?
Troisgros - Eu uso produtos brasileiros, mas de forma muito cuidadosa. Não fujo da cozinha francesa. Eu faço um filé à bordalesa tradicional, mas o coloco sobre uma pequena galette de aipim; se não disser que é aipim, poucos percebem, podem até achar que é batata. Eu uso produtos brasileiros de forma bem afrancesada. Faço uma lagosta com molho de coco. Ou uma crepe com suflê de maracujá.
Folha - Como o público reage a seus pratos?
Troisgros - Aceita bem, mas eu também tento me adaptar ao gosto local. Aprendi isso no Brasil. Quando cheguei aí achava que as pessoas deviam comer do jeito francês. Aprendi a me adaptar -no caso brasileiro, colocando uma pimentinha, aumentando as porções. Outra coisa: o nova-iorquino procura muita novidade, tem a mente aberta para novidades. Esta "fusion cuisine jamais funcionaria em Paris.
Folha - Qual a sua idéia em promover este jantar no Brasil?
Troisgros - A idéia é da Marlene, minha mulher. Ela está cuidando de tudo. Queremos manter um pé bem firme no Brasil, que hoje é mais meu país que a França. Também achei importante promover os chefs daqui. Estes dois são dos mais importantes e têm muitos clientes brasileiros. Além do mais, o Brasil está virando moda aqui.

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