São Paulo, domingo, 1 de outubro de 1995
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Não estão contando a verdade

GILBERTO DIMENSTEIN

O debate sobre desemprego no Brasil está repleto de mentiras, manipulações e meias-verdades. Quem tiver dúvidas basta olhar os Estados Unidos, onde a tecnologia, imaginada para servir o homem, vai cortando desvairada e incontrolavelmente cabeças por todos os lados.
Não é à toa que batalhões de psicólogos, especializados na recuperação emocional de executivos e empregados com curso superior demitidos, estão ganhando muito dinheiro.
Apesar do contínuo crescimento econômico, os EUA cortam 500 mil bons empregos por ano -bom emprego significa trabalho não temporário, período integral e benefícios sociais. Cada vez mais, gente vive de bico, é expulsa para empregos de menor remuneração ou, apesar do diploma, acaba montando um pequeno negócio do tipo vender cachorro-quente. Alguns engrossam a lista dos ``homelesses" (os sem-casa).
O valor médio dos salários está caindo -é, inclusive, menor do que em 1973. Estatísticas mostram que, por causa dessa redução, os pais ficam cada vez menos tempo com os filhos, para recuperar poder aquisitivo. O que, obviamente, vai produzindo um bando de neuróticos mirins.
O pânico no desemprego provoca histeria contra os imigrantes. Até então, o imigrante era tolerado ou bem-recebido porque faria um trabalho rejeitado pelo americano: entregar pizza, catar o lixo ou limpar banheiros. Mas, agora, viraram atrativos. O fechamento de fronteiras e desemprego são, hoje, os principais temas da sucessão presidencial.
O desemprego e suas várias modalidades (subemprego, por exemplo) amedrontam este final de milênio. O governo dos EUA lançou uma série de ofensivas: cursos de reciclagem para profissionais demitidos e estímulo ao ensino básico. É apenas um bem-intencionado curativo num ambiente que, a cada oito minutos, faz uma nova invenção em microeletrônica. A cada dia são anunciadas novas e gigantescas fusões.
Por trás de tudo, vigora uma concepção insana que domina o mundo, liderada pelos EUA: esforço febril para reduzir custos e aumentar eficiência.
Diante de toda essa complexidade, o empresariado brasileiro e, em especial, o paulista, está tentando vender a idéia simplória de que, se os juros caírem, o emprego voltará automaticamente a crescer. Na melhor da hipóteses, é uma meia-verdade ou, se preferir, uma meia-mentira.
Já que a Fiesp está tão sensível à questão social e acredita no efeito tão gigantesco dos juros, deveria assinar um acordo com o governo e trabalhadores: baixados os juros, eles se comprometeriam a manter o nível de emprego, tornando mais criteriosa a introdução de novas tecnologias.
PS - É claro que, diante dessa proposta, eles vão rir da minha cara. É exatamente o que faço quando eles dizem que estão profundamente preocupados com a questão social. Pelo menos aí estamos empatados.

O desemprego afeta mais duramente a juventude, jogando-a na marginalidade. Daí o berço para a delinquência e o tráfico de drogas -o que acaba, óbvio, se refletindo na produção cultural. Com a sua sequência de filmes sobre violência, o cineasta Spike Lee está tomando o lugar de Woody Allen como representante do modo de sentir e pensar em Nova York. Um dos principais temas da vida cultural de Nova York é "Clokers", o último filme de Spike Lee.
Questionado, ele diz que, entre os filmes de que mais gostou, está "Pixote", de Hector Babenco.

Como o assunto é emprego, duas boas notícias para o Rio:
1) Uma equipe do Morgan Stanley, um dos maiores bancos de investimento do mundo, faz esta semana uma rodada na Europa. Quer atrair investidores a jogar dinheiro no Brasil. Um dos destaques da apresentação é o que eles chamam de "renascimento do Rio", devido aos novos investimentos.
2) A cantora Madonna virou propagandista da cidade, num estímulo ao turismo. Diz sempre que nunca viu tantos homens bonitos como no Rio. Até aqui, a propaganda está surtindo efeito na clientela gay, um dos ricos ramos do turismo dos Estados Unidos. Se a moda pegar apenas junto aos homossexuais de Nova York e de San Francisco, o governador Marcello Alencar pode comemorar como se tivesse uma fábrica da Volks instalada por mês -e com a vantagem de que não precisa dar nada para atrair esses dólares.

Recebi protestos -um deles enviado pelo ombudsman- contra nota publicada na coluna de domingo passado sobre palestra do brasilianista Thomas Skidmore na Universidade de Columbia. Ali, fiz comentários sobre a vida íntima do presidente Fernando Henrique Cardoso. Apenas me limitei ao registro.
Por que não deveria publicar? Afinal, Skidmore é um dos mais famosos brasilianistas, falava numa das mais importantes faculdades do mundo para uma platéia extremamente seleta, muitos deles do sistema financeiro.
De duas, uma: ou Columbia pára de convidar Skidmore ou ele pára de falar em público sobre casos extraconjugais de Fernando Henrique Cardoso.

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