São Paulo, quarta-feira, 11 de outubro de 1995
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Sexo, mentiras e outros problemas na Internet

BILL GATES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Pergunta - Estamos tentando conseguir uma conexão com a Internet em nossa escola, mas alguns administradores são contra a idéia.
A Internet não é regulamentada e eles temem que os alunos tenham acesso à pornografia. Acredito que os benefícios da Internet pesem mais que seus problemas. Qual a sua opinião? (Ennio Fano Reyes, Guadalajara, México, ennio@itesocci.gdl.iteso.mx.
Perguntas sobre a necessidade de regulamentação e auto-regulamentação na Internet foram feitas também por muitas outras pessoas, entre elas Cesar Hernando, Madri, Espanha, mtl94049@oasis.dit.upm.es, e Claude Cunningham, África do Sul, zax!mdfh!cunningc@explazax.attmail.com.).
Resposta - Os benefícios são muitíssimo maiores que os problemas, mas isso não significa que devamos minimizar esses problemas.
É verdade que, atualmente, uma criança que use a Internet sem supervisão adulta pode encontrar praticamente qualquer coisa que se possa imaginar -desde informações e opiniões fascinantes até mentiras, xingamentos e pornografia.
Consequentemente, pais, mães e escolas precisam pesar bem o grau de acesso a oferecer e até que ponto esse acesso deve ser supervisionado.
Felizmente, a situação deverá melhorar com o decorrer do tempo, à medida que aumenta a quantidade de informações e entretenimento de alta qualidade disponíveis na Internet, e que são criados mecanismos para ajudar a segregar determinados tipos de conteúdos de pessoas que não devem (ou não querem) topar com eles.
Nunca antes o mundo teve um veículo mundial de publicação de informações. Nem sempre fica claro quem deve ser responsabilizado quando algo é publicado indevidamente -por ser sujeito a ``copyright", por ser propriedade privada de alguém ou por ser difamatório ou pornográfico.
As regras e distinções antigas simplesmente não se aplicam à Internet. Não é como o telefone, pelo qual você conversa com uma única pessoa e pode falar mais ou menos o que quiser.
Mas não é como um jornal, onde existe profissionalismo e responsabilidade explícita pelo que é publicado.
A The Microsoft Network (MSN), que integra a Internet, vai declarar quem considera ser o responsável pelas informações publicadas, em qualquer contexto.
Teremos partes da MSN publicadas pela Microsoft, partes publicadas por outros provedores de conteúdo e partes publicadas por indivíduos (quer esses se identifiquem ou não).
Por exemplo, nosso guia on line de cinema, o ``Cinemania", é informação que nós mesmos publicamos. Mas, quando você está num ``chat room", onde milhares de comentários de milhares de pessoas se misturam e se cruzam, cada enunciado vale por si só, e o indivíduo que o faz é responsável por ele.
Às vezes, é bastante complicado determinar quem publica uma informação em particular. Não apenas os diferentes países têm posições diferentes em relação ao que é ou não aceitável, como também têm posições diferentes sobre as relações entre o originador de uma mensagem e aqueles que possivelmente tenham desempenhado algum papel como intermediários ou condutores dessa mensagem.
Com o tempo, prevejo que qualquer pessoa que publique informação em uma rede terá que enquadrá-la em uma categoria -entre várias categorias previamente convencionadas- para indicar sua natureza.
O software usado para acessar a Internet (ou comunidades eletrônicas comerciais) vai filtrar as informações com base nas categorias em que tenham sido enquadradas. O software para uso infantil vai rejeitar conteúdos adultos, por exemplo.
Para que a divisão em categorias feita pelos próprios emitentes funcione efetivamente é preciso que as fontes de informação em uma rede sejam autenticadas, para que pessoas e empresas possam ser responsabilizadas pelas informações que distribuem eletronicamente.
Hoje não existe proteção desse tipo. Sei muito bem disso, porque a todo momento há pessoas que se fazem passar por mim.
Às vezes esses impostores fazem coisas incrivelmente maldosas, como por exemplo enviar correio eletrônico em meu nome prometendo empregos ou dinheiro às pessoas ou criticando o Apple Macintosh.
Esses trotes são extremamente prejudiciais, mas não há meio de descobrir quem os cometeu.
Não estou sugerindo que acabemos com todas as formas de anonimato. Posso imaginar comunidades eletrônicas em que vale tudo e ninguém pode rastrear as verdadeiras origens de uma informação nem verificar sua autenticidade.
Você entraria em comunidades desse tipo -decidindo ler as informações que elas divulgam (ou assisti-las)- por conta e risco próprios e, se alguém dissesse coisas ofensivas ou falsas a você, seu único recurso seria resolver a questão dentro da mesma comunidade.
Adultos que concordam com essas regras deveriam ter o direito de participar desse tipo de comunidade. Crianças, certamente, não.
Isso nos traz de volta a sua pergunta original. Devem as crianças ter acesso à Internet?
Se eu tivesse filhos, não os deixaria passear pela Internet atual sem supervisão. Mas não lhes negaria o acesso a ela. A Internet é importante demais para ser ignorada ou evitada.

Pergunta - Qual é, na sua opinião, a maior contribuição dos computadores à sociedade? (Tonia Gentile, Nova York)
Resposta - É o fato de serem instrumentos que ajudam as pessoas a ser criativas, começando desde muito cedo na vida.

Pergunta - O senhor acha que soluções de software à base de componentes centrados em documentos, tipo o OpenDoc ou o OLE, vão tomar o lugar dos aplicativos monolíticos? (Scott Anderson, San Francisco)
Resposta - A resposta curta é ``não". Você pode comprar autopeças e montar seu próprio carro sozinho, mas muito poucas pessoas o fazem. A mesma coisa ainda se aplica ao software.
A questão é se grandes aplicativos de software, como processadores de texto, serão substituídos por coleções de componentes interligados, escolhidas pelos usuários de acordo com suas necessidades específicas.
Será que as pessoas vão abrir mão de um produto como o ``Microsoft Word", que possui centenas de componentes, e optar por uma coleção de componentes de processamento de texto (que escolherão para responder especificamente às suas necessidades) interligados por uma tecnologia do tipo da OLE, da Microsoft (uma tecnologia usada para interligar e embutir objetos)?
A razão pela qual eu respondo ``não" é que a pessoa que pretende criar um documento quer usar um programa já testado e comprovado, criado para funcionar como solução total. Os aplicativos completos geralmente custam muito pouco, quando se leva em conta tudo o que são capazes de fazer, e as respostas às dúvidas podem ser obtidas de uma única fonte. É muito difícil uma coleção qualquer de componentes se equiparar a essa capacidade integrada.
Isso não significa que ferramentas componentes não sejam importantes. Muitas pessoas estão optando por acrescentar ou substituir componentes de seus aplicativos, para adequá-los às suas próprias necessidades.
Dando um exemplo simples: os usuários do ``MS Word" podem comprar produtos extras com os quais podem facilmente fazer uma verificação ortográfica ou encontrar sinônimos em mais de uma dúzia de línguas diferentes.

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