São Paulo, quarta-feira, 11 de outubro de 1995
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Desemprego

ANTONIO DELFIM NETTO

A rapidez com que no Brasil a informação se transforma em ``ruído" é fantástica. Quando se fala na necessidade de criação de emprego, a desculpa, invariavelmente, é a de que ``o desemprego atual é estrutural" (produzido por um mercado de trabalho ineficiente), ``é produzido pelo avanço tecnológico" (automação e novas formas de gestão), ``é conjuntural" (produzido pela necessidade de limitar a demanda para reduzir o déficit em conta corrente).
Com isso, se perde a perspectiva do problema, porque todas essas causas são parcialmente verdadeiras, mas elas obscurecem o fato fundamental: uma sociedade relativamente pobre como a nossa só tem condições de manter-se politicamente aberta se for capaz de proporcionar à população uma esperança de crescimento econômico e social.
Não se trata, obviamente, de condenar o desemprego de curto prazo às vezes exigido numa economia de mercado para moderar as aspirações distributivas ou por constrangimentos externos produzidos pela política cambial.
No primeiro caso, o desemprego temporário é instrumento para a volta ao pleno emprego com controle de inflação. Ele é, afinal, o cruel instrumento didático que compatibiliza aspirações conflitantes sobre a distribuição da renda. No segundo caso, ele pode ser superado afinando a política cambial. É óbvio que não se pode corrigir esse desemprego pelo doce remédio keynesiano de aumentar a despesa pública, tão apreciado pelos políticos de todos os matizes.
O que se trata é de enfrentar o problema da oferta. De criar estímulo ao investimento, à poupança e à incorporação de novos conhecimentos e tecnologia. De dar maior eficiência ao sistema de preços, ao mercado de trabalho e de educar a mão-de-obra. É assim que se gera o crescimento endógeno capaz de absorver o estoque dos já desempregados e criar a perspectiva de emprego para os novos chegados àquele mercado.
Como é possível imaginar a sobrevivência do pacto social se nos conformamos com um elevado e crescente nível de desemprego? Como pedir paciência à sociedade, se ele não for passageiro e funcional? Como manter a juventude esperançosa se não mostrarmos que a demanda de mão-de-obra vai crescer em quantidade e qualidade e vai privilegiar o investimento no capital humano?
As pessoas suportam melhor o sofrimento e os sacrifícios de curto prazo se sabem que eles são a preparação para a sua superação no longo prazo. O país precisa da perspectiva de que os custos do ajuste são inevitáveis, mas felizmente temporários.
Em princípio, não existe nenhuma razão pela qual a sociedade, se assim o desejar, não possa ter, simultaneamente, uma baixa taxa natural de desemprego e a taxa necessária de crescimento, sem pressões inflacionárias e com o déficit em conta corrente desejado. Não se pode é aceitar sem discussão a proposição de que o crescimento anual, abaixo de 5% nos próximos cinco anos, como sugerido no Plano Plurianual, é uma exigência da lógica econômica. Se nos conformarmos passivamente com esse dogma, estaremos condenando milhões de brasileiros à miséria e à não-cidadania. E pondo em risco a estabilidade já precária do nosso pacto social.

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