São Paulo, sexta-feira, 13 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Turismo é para discípulos de Átila, o Huno

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

Se você é do tipo que adora passar o feriado se esquivando de jet skis, comendo aquela comida cara e fétida dos restaurantes do litoral e prendendo o dedo em cadeira Rochedo, neste momento você deve estar se sentindo em shangrilá. Tem gosto para tudo, não é mesmo?
Não quero estragar seu merecido repouso, claro, mas não custa lembrá-lo, ó leitor turista acidental sem visto de entrada, de que dentro de 50 e poucas horas você estará enfrentando um trabalhoso retorno à cidade.
Não há dúvida de que o paulistano classe média tem vocação para sofredor. Continua insistindo em enfrentar 201 quilômetros de congestionamento a fim de sair da cidade, só para chegar àquela promiscuidade chinfrim em que se transformou, nos feriados, o litoral norte.
Dá para entender? Se ainda fosse só para ir pagar promessa em Aparecida do Norte, vá lá. Mas para que deixar São Paulo justamente quando a cidade vive seus únicos momentos de tranquilidade?
A fascinação pequeno-burguesa pelo turismo é uma praga mundial. No ano passado, o prefeito do balneário italiano de Capri foi forçado a proibir a entrada de ônibus de turismo na cidade. Veneza tenta contornar o problema elevando seus preços às alturas. Uma Coca-Cola na piazza San Marco chega a custar U$ 30.
Bali foi invadida por turistas australianos de camiseta regata e tamanco dr. Scholl e até paraísos remotos como as ilhas Maldivas já estão se acostumando a conviver com hordas de turistas italianos que desembarcam do Jumbo de mochila nas costas.
O pior é que o maldito do turista classe média sente-se à vontade para se comportar feito Átila, o Huno. De óculos espalhafatosos de triatleta e bermudões coloridos, ele pilha as cidades por onde passa e exige que todos entendam sua língua. E sempre volta para casa com a impressão de ter conhecido bem o lugar onde esteve, mas sem ter entendido lhufas.
A única coisa que interessa é exibir aos amigos as fotos da viagem. Para mostrar que ele é internacional e que seu poder aquisitivo pode comprar a felicidade em várias línguas.
Ó vida, ó dor...

Texto Anterior: Polícia é `enganada' 3 vezes em 39 dias
Próximo Texto: Dedo-duro; Banguela; Divertimento adulto; Guaribada
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.