São Paulo, sexta-feira, 13 de outubro de 1995
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Recurso de perua

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Sem vontade política nem interesse pessoal em promover a única reforma realmente necessária, que é a agrária, o governo empulha a nação e distrai a classe política com reforminhas de maquiagem, tentando recauchutar a cara do Estado.
Como perua velha que necessita de ``peeling" em busca da modernidade que lhe traga a juventude perdida ou nunca tida, o governo quer cortar o excesso de pelancas por intermédio das reformas fiscal e administrativa.
Que são necessárias, são. A afobação de FHC em armar maiorias no Congresso para corrigir a Constituição devia ser endereçada à única reforma que conta, a da terra. É a única que, a médio e longo prazo, fará do Brasil um país realmente moderno e, conforme as circunstâncias, socialmente justo.
As demais reformas, essas que o governo vem obtendo do Congresso a duras penas e cujo preço um dia saberemos, por mais importantes que sejam, são simples paliativos de caixa, tarefa de guarda-livros, arrumação eternamente provisória do fisco, que muda de tempos em tempos sem resolver problema algum.
A reforma administrativa é de aberrante hipocrisia. Além do problema legal nela embutido, pergunta-se: quem inchou o quadro de funcionários públicos? A Rússia, os Estados Unidos, o papa, o Dalai Lama? Depois dos militares (que em linhas gerais apoiaram FHC), quem esteve no poder esses anos todos? O PT, o PDT, os partidos nanicos oriundos do partidão?
Quem inchou o funcionalismo público (estadual e federal) foi basicamente a aliança política que está no poder. Derrubando a estabilidade, abrem-se claros que serão moeda de troca para a reeleição de FHC. Pois todos sabemos que são duas as moedas que custeiam uma campanha vitoriosa: as doações (vd. caderno especial da Folha mostrando quem deu o que para quem) e os cargos públicos para absorver filhos, noras, genros, cunhados, cabos eleitorais e burocratas dos partidos no poder.
Reforma administrativa equivale a mudar os móveis de lugar numa casa com quintal enorme que poderia matar a fome de toda a família.

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