São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 1995
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Sociólogas brigam em discussão sobre aborto

FERNANDO DE BARROS E SILVA
ENVIADO ESPECIAL A CAXAMBU

Sociólogas brigam em mesa-redonda sobre aborto
A descriminalização do aborto rachou as sociólogas na 19ª reunião anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais), em Caxambu (MG), e provocou ontem a primeira troca de insultos entre grupos feministas.
A presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), Rosiska Darcy de Oliveira, foi acusada de estar agindo contra a orientação do documento que ela mesma assinou há um mês, no item referente à prática do aborto, durante a 4ª Conferência Mundial da Mulher, realizada em Pequim (China).
Rosiska, que chefiou a delegação brasileira depois que a primeira-dama, Ruth Cardoso, deixou a China, foi uma das signatárias do documento endossado por 181 países, que a certa altura pede aos governos que "considerem a possibilidade de rever as leis que prevêem medidas punitivas contra mulheres que tenham feito aborto".
Ontem, Rosiska foi acusada de ter declarado à imprensa que a descriminalização do aborto "não estava sendo cogitada no Brasil".
A declaração atribuída à presidente do CNDM, publicada em nota do jornal "O Globo" no último dia 7, foi desmentida por ela.
"Plantaram essa notícia, eu nunca disse isso. Só quero lembrar que a questão do aborto é da sociedade como um todo e não das feministas. O conselho que eu presido não assumirá a defesa da descriminalização do aborto enquanto não houver na sociedade opinião clara sobre o tema", disse.
Segundo Rosiska, ela está consultando sete juristas mulheres a respeito dos itens do Código Penal que tratam do aborto e nem entre elas "existe qualquer consenso a respeito do assunto".
Bate-boca
A declaração acirrou os ânimos da reunião e transformou a mesa-redonda num bate-boca.
"Eu não quero saber das suas juristas. Tem jurista católica, maometana, budista, o raio que os parta. Você está no poder e eu quero ter o direito de falar", disse exaltada a socióloga Hildete Pereira Melo, da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Rosiska se disse "estarrecida". "Isso deveria ser um encontro acadêmico e não um comício. Eu nunca admiti essa gritaria dos meus alunos em sala de aula, quando era professora", retrucou.
Várias sociólogas se retiraram da sala em sinal de protesto. Hildete Pereira, ao sair, disse "vá tomar banho, eu não sou sua aluna".
No início da noite de ontem, um grupo de feministas, liderado por Hildete e a socióloga Lena Lavinas, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), estava reunido para redigir um documento formalizando um protesto à posição da presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.

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