São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Debate critica falta de dados de violência

RICARDO BONALUME NETO
ENVIADO ESPECIAL A CAXAMBU (MG)

Apesar de São Paulo ter o melhor sistema de saúde do país, em um ano é possível que morram 22 mil pessoas no Estado sem que se saiba a causa. No Rio, o número é menor -6.000 mortos. As estatísticas refletem os problemas que os sociólogos têm em entender o verdadeiro grau da violência no país.
Os números foram citados pela cientista social Alba Zaluar ontem na 19ª reunião da Anpocs. Para ela, seria preciso uma pesquisa para indicar quem são esses mortos.
Zaluar, professora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e da Uerj (Universidade Estadual do Rio), suspeita que muitos médicos não reportam todos os crimes violentos; em certos momentos e locais, "até para os médicos é perigoso" fazer isso.
A mesa-redonda debateu a ação militar na luta contra o crime no Rio. Várias estatísticas mostram a dificuldade dos pesquisadores em conseguir dados precisos. Ironicamente, os registros de homicídios estão entre os mais confiáveis.
A ação militar na luta contra o crime foi considerada mais de valor "psicológico", segundo Hector Luis Saint-Pierre, da Unesp (Universidade Estadual Paulista).
Todos concordaram que o crime não diminuiu e que a organização dos criminosos não foi abalada.
Mas a ação foi considerada útil por ter freado o processo de desmoronamento do Estado. Ela permitiu iniciar mudanças na polícia.
E apesar dos abusos, os militares foram menos violentos do que a polícia costuma ser. "O favelado prefere o Exército porque ele não chega atirando", diz Zaluar.
A reforma da polícia foi o tema mais debatido, especialmente por Domício Proença Júnior, da UFRJ (Universidade Federal do Rio). Ele defendeu uma polícia que seja uma força de "ordem pública". E citou como exemplo a Alemanha.
Para ele, os alemães souberam criar uma polícia vinculada à comunidade local -o que facilita as investigações- e é recrutada entre pessoas que querem fazer carreira por vocação. "Existe até universidade da polícia", diz ele.
Domício acha que reformar a polícia, tornando-a respeitadora em vez de violadora dos direitos humanos, é uma maneira de "desfiar o nó da violência".
Sergio Adorno, do Núcleo de Estudos de Violência da USP, disse que não é possível pensar em uma polícia da ordem pública em um país em que esta não se generalizou. "O problema da democracia brasileira é garantir os direitos civis da população", disse o historiador José Murilo de Carvalho, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro).
Domício negou que tivesse defendido a adoção do modelo alemão: "Um policial brasileiro em ação na Alemanha seria preso em meia hora. Um policial alemão no Rio estaria boiando na baía da Guanabara em 12 minutos".

Texto Anterior: Sociólogas brigam em discussão sobre aborto
Próximo Texto: Número de inscritos na Unesp cai 1,15%
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.