São Paulo, sábado, 21 de outubro de 1995 |
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'Sherazade' retrata perda do amor com exuberância e sensualidade
MÔNICA RODRIGUES COSTA
A peça conta sobre as noites da famosa princesa, que entretém o sultão com histórias maravilhosas para evitar a morte, depois que o rei descobre ter sido traído pela primeira mulher. O sultão resolve então assassinar todas as esposas que viesse a ter. Narrativa Exuberância e sensualidade são as palavras mais adequadas para caracterizar a montagem, dirigida por Tomaz Pandur, com texto de Ivo Svetina. Sem "domesticar suas árabes", para citar Jorge Luis Borges ao comentar traduções do "Livro das Mil e Uma Noites", o espetáculo flui -ainda que não tenha sido possível entender a língua em que foi falado-, conduzido por uma narrativa "apaixonada e triste". O enredo de "Sherazade" é fora do comum. Aprofunda o conhecimento do conto atribuído aos árabes e coloca questões, como disputa de poder entre irmãos e perda do amor. O sultão Shahriar é o senhor da luz que enlouquece, o déspota mais poderoso, que arruína o serralho. Governa a partir do prazer, exacerbado devido ao consumo do ópio. Sua irmã, a princesa corcunda Nur, apóia o sultão com a sabedoria que o destino lhe reservou. Shahzeman, dono das trevas, vidente, prevê e avisa a traição a Shahriar. É seu irmão mais velho. A rainha mãe o cegou em obediência a determinações míticas para evitar a destruição do reino. Shahriar deveria ser o sultão. A peça tem o fulcro centrado no embate entre irmãos e na posterior destruição do reino maravilhoso, apesar do esforço da rainha para fugir da determinação trágica. A primeira mulher do harém, objeto de paixão maior do sultão, trai o marido. Não há consolo para Shahriar. Ele passa a assassinar mulheres, até que ouve a história de sua vida. O escritor argentino Borges pergunta: "Não é portentoso que na noite 602 o rei Shahriar ouça da boca da rainha sua própria história?". Para Borges, trata-se da "cena dentro da cena, como na tragédia de Hamlet, elevações da potência do sonho". "Sherazade" retrata a arbitrariedade e crueldade de um rei em cenas delicadas, de iluminação sublime. As coreografias suaves destacam a intensa sensualidade das belas odaliscas. O figurino exuberante contrasta com o cenário cinza, cheio de planos, que diversifica os pontos de vista sobre a narrativa. O movimento dos atores dançarinos ocupa todo o espaço, ampliado ora em profundidade ora em uma superfície enevoada, onírica, provocada pela fumaça que sobe do chão. Para maior assombro, continua Borges, "as ante-salas se confundem com os espelhos, a máscara está debaixo do rosto, ninguém sabe qual é o homem verdadeiro e quais são seus ídolos e nada disso importa; essa desordem é trivial e aceitável, como as invenções do entressonho ". Texto Anterior: Peças italianas ficam em cartaz até hoje Próximo Texto: "Matança de Porco" tematiza a loucura e a injustiça da sociedade Índice |
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