São Paulo, domingo, 22 de outubro de 1995
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Líder é funcionário do MST

GEORGE ALONSO
DO ENVIADO ESPECIAL AO PONTAL DO PARANAPANEMA

O principal líder dos sem-terra do Pontal do Paranapanema é "profissionalizado" pelo MST. José Rainha Jr. ganha do movimento, todo mês, três salários mínimos. "É uma ajuda de custo que todas as lideranças do MST recebem. Fico com uns R$ 280 porque pago Unimed", afirma ele.
Como viver com tão pouco? Rainha afirma que sua renda mensal tem atingido "a casa dos R$ 500". Suas andanças pelo país, diz ele, ficam por conta do MST.
O complemento de aproximadamente R$ 200 por mês está vindo, afirma Rainha, da venda dos produtos agrícolas produzidos na fazenda São Bento (assentamento provisório de sem-terra) por um grupo de 14 famílias, associadas em uma área de 56 hectares, dos quais 4 pertencem a Rainha.
Nascido em Córrego dos Sete, em São Gabriel da Palha (ES), onde passou toda a infância, Rainha é um homem simples, de olhar quase tristonho. Não deixa transparecer a forma determinada com que conduz os sem-terra.
Filho de camponeses ("meus pais eram meeiros, colonos numa fazenda"), aprendeu a ler e a escrever, em Linhares (ES), já adolescente. "Trabalhei na roça do café desde os sete anos. Como tinha de trabalhar para comer, não pude ir à escola, que era longe".
Hoje, porém, Rainha fala ou discursa com desenvoltura sobre as questões do campo, sempre sob a ótica da esquerda ortodoxa.
"Outro dia, um jornalista me fez uma pergunta idiota. Queria saber se eu daria terra se fosse fazendeiro. Disse que não. Mas acontece que sou fruto de outro meio, o dos trabalhadores e luto pela minha classe", explica.
Dentro do MST, é uma das lideranças mais importantes como organizador de ocupações. Em Linhares, participou das comunidades eclesiais de base ("lá me formei") e, em 78, conheceu frei Betto, um dos principais formuladores da Teologia da Libertação no Brasil. "Me inspirei nele."
No ano seguinte, já estava organizando a oposição no sindicato local dos trabalhadores rurais. Seu grupo venceu a eleição, e ele coordenou a comissão agrária sindical.
Em 29 de janeiro de 1985, ingressou no MST, participando do congresso de fundação do que é hoje a maior entidade de trabalhadores rurais sem terra do país.
Apesar de se manter firme à frente dos sem-terra, Rainha teve neste ano uma grande tristeza. "Perdi meu pai em abril, e isso desnorteou tudo", diz, e deixa as mãos escorregarem até os pés. Alisa, pensativo, um par de tênis da marca Rainha.

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