São Paulo, domingo, 22 de outubro de 1995
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Igrejas querem fixar diferenças de evangélicos

CARLOS EDUARDO ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Os chutes do bispo Sérgio Von Helder não ameaçam a suposta tradição de tolerância religiosa no Brasil, mas delimitam definitivamente para o público externo as diferenças entre a Igreja Universal do Reino de Deus e as igrejas evangélicas históricas, acreditam os líderes dessas igrejas.
"Esse episódio será superado e não afetará a liberdade e tolerância religiosas", diz, por exemplo, Adriel de Souza Maia, bispo-presidente da Igreja Metodista no Brasil.
Maia, no entanto, reconhece que os metodistas também têm sofrido uma sangria de fiéis por conta do crescimento da Igreja Universal. "Eles (Universal) apostam na prosperidade imediata, na doação em troca da bênção. Trata-se também de um fenômeno social", acha o bispo metodista.

'Guerra santa'
Assim como os metodistas, os anglicanos não enxergam na agressão de Sérgio Von Helder potencial para detonar uma "guerra santa" no país.
"Não se ataca o símbolo de outras religiões, mas a tolerância religiosa no Brasil tem força suficiente para superar o episódio", acredita Sumio Takatesu, bispo-emérito da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil.
Embora sua igreja tenha em comum com a Universal o rótulo de evangélica, Takatesu faz questão de bradar a diferença. "Não há semelhança alguma, nem de doutrina. Nós discordamos desse tipo de cristianismo", afirma.
O bispo anglicano diz que, junto com outras religiões, está estudando as razões do crescimento da Igreja Universal.
Com menos restrições às práticas da Universal, a Igreja Presbiteriana do Brasil mesmo assim solidarizou-se com os católicos.
"A nossa igreja, em obediência à palavra de Deus, é contra a idolatria, mas não podemos tolerar gestos que comprometam a convivência respeitosa entre os diferentes segmentos da fé cristã", afirma o reverendo Guilhermino Cunha, presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil.

Quadro novo
Os presbiterianos se dividem em três ramos no país e a igreja liderada por Cunha é a mais numerosa delas. O reverendo acha que a Igreja Católica não tem dado sinais de intolerância, mas nota que uma nova realidade preocupa os católicos.
"O crescimento notório da igreja evangélica no Brasil e na América Latina tem incomodado a Igreja Católica", acha Cunha.
Para o dirigente presbiteriano, a Universal cresce ao responder a uma demanda de "necessidades espirituais" de maneira que nenhum outro segmento religioso estaria fazendo.
"Vejo muita gente sincera participando da Igreja Universal", afirma Cunha. O "bate e assopra" do pastor reserva também uma esperança de reverter o quadro de adesões à igreja liderada pelo bispo Edir Macedo.
"Cedo ou tarde, fiéis da Universal poderão procurar e serem acolhidos pelas igrejas históricas, desde que estejam prontos a estudar com seriedade a palavra de Deus", declara Cunha.
Outro numeroso grupo evangélico, o luterano, também não crê que a liberdade religiosa esteja ameaçada com a crise gerada a partir do caso Von Helder.
"Um episódio específico não pode ameaçar a tolerância", avalia Huberto Kirchheim, pastor-presidente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil.
Kirchheim diz que sua igreja mantém relações amistosas com os católicos. Não há, segundo ele, nenhuma proximidade com a prática da Igreja Universal.
"Ao contrário dela (Universal), entendemos que o Evangelho não é a proposta de prospeperidade, mas sim a do Cristo que se humilha para ficar próximo dos simples", diz o líder da maior corrente luterana no país.
Apesar da crítica, Kirchheim admite "alguma perda" de fiéis para a Universal. O pastor luterano atribui o fato a uma questão sociológica, já que os seguidores de Macedo seriam arrebanhados graças ao clima de miséria e desesperança no país.
"Não vamos crescer em cima da miséria humana, mas ao mesmo tempo não devemos negar que temos de aprender alguma coisa do jogo claro de marketing da Igreja Universal", afirma Kirchheim.
Entre as chamadas igrejas históricas, a Batista é a mais refratária ao ecumenismo.

Isolacionistas
Falando em nome pessoal, o pastor Júlio Sanches, presidente da Convenção Batista de São Paulo, condena formalmente a "atitude agressiva" de Von Helder, mas destaca a responsabilidade histórica dos católicos por episódios de confrontação.
"A Igreja Católica está colhendo o que plantou. Ela sempre foi intolerante", afirma o dirigente batista.
Fiel à fama de isolacionistas que os batistas cultivam no meio religioso, Sanches não poupa, no entanto, a Igreja Universal.
"Nós trabalhamos no meio dos miseráveis, mas não exploramos a miséria como eles fazem", ataca o líder religioso.
Para Sanches, o fenômeno da igreja do bispos Edir Macedo terá fôlego curto.
"Como não há consistência doutrinária, esse tipo de modismo acaba logo", arrisca o palpite.

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