São Paulo, domingo, 22 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Filamentos podem explicar Alzheimer

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Na doença de Alzheimer, grave degeneração cerebral, os neurônios (células nervosas) apresentam dois tipos principais de lesões: as placas senis e os emaranhados neurofibrilares.
As placas caracterizam-se pela presença de massa redonda de uma proteína chamada beta-amilóide, potencialmente neurotóxica e cuja origem, natureza e efeitos têm sido objeto de pesquisas e discussão. Para alguns especialistas, elas são causa da degeneração, para outros, mera consequência.
Ao contrário delas, os emaranhados têm sido pouco estudados e só recentemente vêm despertando ativo interesse.
Eles são constituídos de alteração de uma proteína chamada tau, que desempenha importante papel na vida do neurônio. Em 1991, John Trojanowski e Virginia Lee, da Escola de Medicina da Universidade da Pensilvânia (EUA), demonstraram que os emaranhados são formados de filamentos pareados helicoidais (PHF) de tau.
Mais recentemente, em 1995, os dois autores, em colaboração com outros, publicaram nos Anais da Academia de Ciências de Nova York experiências que revelaram que, nas células atacadas pela Alzheimer, faltam as fosfatases, enzimas que removem grupos fosfáticos da tau.
A proteína fica, assim, com mais fosfatos do que devia, o que provavelmente a impede de realizar uma de suas funções vitais, que é fixar partes essenciais do esqueleto celular (citoesqueleto), prejudicando a célula e terminando por formar aglomerados que se precipitam na substância celular.
Verificou-se ainda que quantidades, mesmo pequenas, de alumínio reforçam esses aglomerados. O alumínio tem sido muitas vezes associado pelos pesquisadores às lesões da Alzheimer.
O papel da diminuição da desfosforilação (remoção dos fosfatos) deve ser considerado com atenção no mecanismo da alteração da tau na Alzheimer, porém não se deve supor que o decréscimo na atividade das fosfatases seja a causa da doença, pois outros fatores podem deflagrar o problema da regulação da enzima. Essa advertência foi feita por Dennis Selkoe, da Universidade Harvard ("Science", 267, 793).
No interior do neurônio existe um sistema de microtúbulos que serve ao transporte de materiais básicos da vida e da estrutura celular. Esses microtúbulos podem ser comparados aos trilhos de uma ferrovia, cujos dormentes são constituídos por tau. É fácil compreender que qualquer deficiência nesses dormentes prejudique os trilhos (microtúbulos), com sérias repercussões na vida celular.
Apesar de intensamente procuradas nos últimos tempos, ainda não se conhecem as causas da transformação da tau nos maciços de tau-PHF. Tem-se lembrado a ação de cinases (enzimas que adicionam fosfatos às proteínas), de fosfatases pouco ativas e de outras substâncias, porém nenhuma dessas hipóteses se confirmou.
Mas várias experiências sugerem que, nos neurônios doentes, ocorre subprodução ou inibição de fosfatases, o que representa sério perigo para a capacidade da tau de manter firmes os microtúbulos.
A tendência do tau-PHF é, então, firmar emaranhados que paralisam o sistema de microtúbulos e acabam matando os neurônios. Há, porém, especialistas que acreditam que os emaranhados sejam um passo apenas na degeneração dos neurônios, e não sua causa. É possível, segundo Selkoe, que a causa primária seja genética e envolva ao mesmo tempo placas senis e emaranhados neurofibrilares.

Texto Anterior: Conferência discute o tema
Próximo Texto: AMNÉSIA; PÊLOS; SEXO; PALAVRA
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.