São Paulo, terça-feira, 24 de outubro de 1995
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A Itália e os crimes financeiros

LUÍS NASSIF

O controle estrito do fluxo cambial seria a maneira mais eficiente de combater o dinheiro da contravenção? Essa possibilidade -que surgiu no país nos últimos dias, no âmbito de denúncias de operações ilegais no mercado de dólar flutuante- não é considerada pelo juiz Giannicola Sinisi, secretário-geral da Fundação Falcone e da comissão que investiga os crimes da Máfia na Itália, que chegou a São Paulo para participar de seminário sobre o tema.
No modelo italiano, é livre o fluxo de entrada e saída de dólares. Os instrumentos de que dispõe a Justiça são de outra ordem e têm como peça central a ampla flexibilização do conceito de sigilo bancário.
Para a Justiça italiana, só há uma única circunstância que justifica a manutenção do sigilo: segredos empresariais entre concorrentes. Fora isso, não existe limite para a quebra do sigilo. O problema maior das autoridades é saber identificar a informação relevante, dentro do volume de informações disponível no sistema financeiro.

Gerente de banco
De qualquer maneira, a quebra do sigilo e os procedimentos judiciais em geral só se justificam a posteriori, quando existem indícios de procedimento criminoso.
Para a prevenção, Sinisi é suficientemente realista para considerar que o único procedimento eficiente é a mudança do padrão ético do sistema financeiro e da sociedade em geral.
A Justiça italiana tem como ponto central na repressão a figura do gerente de banco, o sujeito responsável pela análise das informações do correntista na hora de abrir a conta.
No início, o sistema financeiro reagiu com reticências a esses controles. Temia que pudessem fortalecer bancos concorrentes, de outros países da Comunidade Econômica Européia. Com o tempo, entendeu que, mesmo minoritárias, as operações ilegais comprometiam as operações legais. Mudou-se a ética do sistema, que passou a colaborar estreitamente com as autoridades.

Globalização
Depois do controle na abertura das contas, o governo atua em duas pontas. Numa, por meio de seu banco central, que cuida dos aspectos gerais das operações, além do controle estatístico daquelas de maior valor. Toda operação acima de 20 milhões de liras (R$ 13 mil) precisa ser informada às autoridades. Na outra, por meio da Receita, que atua individualmente depois de constatados indícios de crime.
A globalização da economia impede um controle estrito do dinheiro da contravenção. Depois que o dinheiro bate em um paraíso fiscal, dificilmente se encontra seu rastro. Além disso, a proliferação das transações eletrônicas complicou ainda mais o rastreio.
Por isso mesmo, Sinisi considera que apenas uma colaboração entre países e a uniformização de procedimentos legais, com menor ênfase às normas e mais aos procedimentos, permitirá maior eficácia no controle da contravenção.
Mesmo com o crime subsistindo, Sinisi julga que pelo menos um avanço fundamental se obteve na Itália. Antes da Operação Mãos Limpas, havia a sensação de que a corrupção era um dado inevitável. Hoje, padrões éticos estão sendo reconstruídos, dentro da visão de que ela pode ser controlada.

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