São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
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Plano de transferência cria defasagem salarial

Programa tira 2.289 pessoas de suas cidades

DANIELA PINHEIRO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A política do Banco do Brasil para reduzir seus prejuízos financeiros fez seus funcionários, que até alguns anos integravam a elite do funcionalismo, conhecerem o Brasil real.
Dentro de seu programa de contenção de despesas, o banco incentivou demissões voluntárias, com benefícios financeiros, e obrigou outros bancários, considerados dispensáveis, a escolher uma cidade para serem transferidos -ou isso, ou a mudança compulsória.
Os 2.289 rejeitados do BB sabem agora o custo que terão de arcar pela decisão de aceitar a transferência.
Nas cidades do interior onde moravam, o salário médio de R$ 600 dava para pagar escola particular dos filhos e manter as despesas da casa própria.
Esse dinheiro, para aqueles que, por exemplo, mudaram para Brasília, não cobre nem o aluguel de um apartamento de dois quartos, que varia de R$ 600 a R$ 800.
José Joaquim Nunes, 37, foi obrigado a deixar Santana (BA), onde é dono de uma casa de cinco quartos, três banheiros e área de lazer com churrasqueira. No Distrito Federal, ele mora na casa de um irmão em Samambaia, cidade-satélite parecida com uma favela. "Estou humilhado. É terrível ter que passar por essa situação após 12 anos de carreira."
O DF recebeu 435 transferidos. Outras 307 vagas devem ser completadas até o final de outubro.
A penúria inesperada provocou o êxodo para cidades-satélites e municípios de Goiás distantes até 50 Km de Brasília, para encontrar um aluguel mais baixo ou morar de favor na casa de parentes.

Separação da filha
O casal Ivan Alves da Cunha, 27, e Hilzenar Souza Cunha, 24, veio de Serra Dourada (BA) e teve de se separar da filha de dois anos, que ficou com a avó. Motivo da separação: não têm como pagar babá e aluguel -os salários de ambos somam R$ 700.
Os Cunha estão hospedados no apartamento de dois quartos de um tio solteiro no Guará, cidade-satélite. "É muito constrangimento. Ele quer levar as namoradas lá e não tem privacidade", disse Ivan, proprietário de uma casa com 750 metros quadrados na Bahia.
A situação desses bancários só não é pior porque recebem uma ajuda diária de R$ 36 -ou R$ 1.080 a mais por mês para "gastos de instalação", até novembro.

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