São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
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Bancos do futuro

Desde o início do ano as dificuldades do sistema bancário vêm ganhando relevo na economia brasileira. Da intervenção no Banespa ao colapso do Econômico, passando por ciclos recorrentes de boataria sobre a fragilidade de instituições e por episódios de liquidação de instituições inadimplentes, a reestruturação segue seu curso.
É aliás o que ocorreu, com graus variados de instabilidade e ruptura, nas economias da Argentina, do México, da Venezuela e de outros países submetidos a um ajuste econômico que, globalmente, ainda não está concluído.
Não se trata sempre, em cada caso, necessariamente de crises bancárias no sentido clássico, com pânicos, colapsos estruturais e mergulho na estagnação. Mas os riscos, estes sim são clássicos.
Uma política de estabilização não é apenas um esforço de redução ou eliminação da inflação.
O desafio maior é reconstruir o dinheiro. Várias vezes se congelaram preços, taxa de câmbio ou tarifas públicas. A inflação caiu, já foi até zero. Mas não surgia um novo padrão para a medida de valores, uma referência para cálculos, para contratos, para planejamento de investimentos ou despesas futuras.
A credibilidade de uma moeda depende de fatores como o ajuste das contas públicas, a inserção internacional ou a disponibilidade de bens e serviços. Mas é no sistema financeiro que se julga e mede, dia a dia, hora a hora, a confiança e o estado das expectativas quanto à viabilidade da estabilização.
Entre os indicadores mais imediatos da estabilidade (uma dada taxa de inflação) e os fundamentos da estabilidade duradoura (contas públicas, contas externas e orçamentos em ordem), os mercados monetário e de capitais funcionam como uma ponte.
As instituições financeiras são como uma ponte pênsil entre o presente e o futuro. São um complexo mecanismo de tradução e avaliação da confiança na própria possibilidade de chegar ao futuro.
Pois bem, e se esse mecanismo complexo, esse filtro da credibilidade, estiver ele mesmo emperrado, poluído, disléxico?
O fato é que o sistema financeiro não é um componente neutro ou passivo no processo de estabilização. É uma peça afetada pelo processo, mas que também condiciona, às vezes de modo terrível, o próprio sucesso da estabilização.
Causa e efeito, médico e monstro, Dr. Jekyll e Mr. Hyde, hiper-racional e sujeito a pânicos, o sistema financeiro brasileiro deve mudar para que a economia toda mude.
Mas o ajuste dessa sensível máquina do tempo está atrasado.

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