São Paulo, quarta-feira, 1 de novembro de 1995
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Oja Kodar quer lançar o último filme de Welles

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Oja Kodar, 54, a mulher com quem Orson Welles (1915-1985) viveu seus últimos 20 anos, tentará lançar nos próximos meses o último filme realizado pelo cineasta antes da sua morte.
"The Other Side of the Wind" (O outro lado do vento) é a história de um diretor de cinema e das dificuldades da profissão. Foi rodado há quase 20 anos em Hollywood e no Arizona. O cineasta John Huston faz o papel principal.
Oja (pronuncia-se Oia) é croata e conheceu Orson Welles quando ele filmava "O Processo". Desde então, atuou como co-roteirista e co-produtora de seus filmes.
Oja Kodar faz parte do júri da 19ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e trouxe para o evento o documentário "Orson Welles - The One-Man Band" (A banda de um homem só). Sobre "It's all True", com cenas do Brasil, Kodar diz "que Orson jamais faria o que fizeram, afinal, com o filme".
Leia a seguir trechos da entrevista que ela concedeu à Folha:

Folha - Quais são seus próximos planos em relação aos filmes inacabados de Welles?
Oja Kodar - Depois dessa mostra, vou a Los Angeles tentar levantar dinheiro para terminar "The Other Side of the Wind". Tivemos problemas com o co-produtor, um iraniano, e nunca conseguimos terminar a produção. Tem John Huston no papel principal e os atores Peter Bogdanovich, Norman Foster, Mercedes McCambridge e eu. É sobre os problemas de um diretor de cinema.
Folha - Quantos filmes vocês fizeram juntos?
Kodar - Escrevemos quatro ou cinco roteiros e fizemos "The Deep", "F for Fake" e "The Other Side of the Wind". Começamos também "The Dreamer", em segredo. Era sobre Isak Dinesen, autora de "Out of Africa".
Folha - Em segredo?
Kodar - Sim, para que as pessoas não dissessem: "Lá vai ele de novo, começando filmes que nunca termina". É uma crítica terrível contra um cineasta. Não somos como escritores, que só precisam de papel e tinta. Filmes Kodak custam uma fortuna. De qualquer forma, não terminamos o filme. Orson morreu antes.
Folha - O que a sra. tem a dizer sobre "The One-man Band"?
Kodar - O título retrata exatamente o que Orson era, um homem que fazia quase tudo sozinho. Dos 90 minutos do documentário, 80 minutos foram dirigidos, produzidos, editados e atuados pelo próprio Orson Welles. O filme mostra Welles como poucos o conhecem. É possível vê-lo como um palhaço. É difícil de acreditar.
Folha - Qual a sua avaliação sobre esta mostra de cinema?
Kodar - Diria que o único problema é o fato de o público ter feito a pré-seleção dos filmes que o júri final vai escolher. Não acho que isso seja justo com o júri ou com o público geral. Não quero ser pedante, mas o júri não deveria sofrer esta restrição.
Folha - O que a sra. achou do resultado final de "It's all True"?
Kodar - Orson jamais faria o que fizeram, afinal, com o filme. O filme era sobre gente pura, samba e toda esta vida que o Brasil possui. A trilha que colocaram no filme parece uma marcha fúnebre, é horrível.
Folha - Do que viu, algo a impressionou muito no Brasil?
kodar - Fiquei impressionada com a pobreza e com a poluição dos rios. Este rio que vocês tem em São Paulo é inacreditável. Como as autoridades não fazem nada a respeito? É difícil acreditar que havia dois crocodilos nesse rio. Deviam ser biônicos.
Folha - Welles fez o melhor filme que a sra. já viu na vida?
Kodar - Não. Foi Jean Renoir, em a "A Grande Ilusão".

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