São Paulo, terça-feira, 7 de novembro de 1995
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Juizado Especial

<UN->CLITO FORNACIARI JÚNIOR

CLITO FORNACIARI JÚNIOR
Incapaz o Brasil de resolver os problemas de sua Justiça, lançam-se leis novas a cada instante, buscando soluções capazes de levar a tutela jurisdicional às pessoas, mesmo que não seja lá rigorosamente justa. Com essa preocupação, vem à luz a Lei 9.099, dispondo sobre Juizados Especiais, dando um rito diverso para as demandas cíveis de menor valor e para as contravenções e crimes com penas não superiores a um ano.
O procedimento define-se como simples e informal, objetivando resolver mais rapidamente os conflitos. Cria a figura de juízes leigos e conciliadores; dispensa, em princípio, custas e honorários; os recursos não são julgados por tribunais; em muitos casos, dispensa-se até o advogado.
Gostaria de proclamar a descoberta da mágica da Justiça. Contudo, por dever de honestidade, isso não posso afirmar. O rito não ganha muito dos velhos procedimentos. Ademais, não sairá barata a formação dessa jurisdição de bagatela.
De outro lado, ela vem deixar mais claras as nossas injustiças. Aquele que vier a cometer um pequeno delito será julgado celeremente e assim punido. Já quem cometer um grande delito continuará sujeito aos procedimentos comuns, com direito de dilargar sua defesa, estender-se em provas e recursos, ficando, ao longo do processo, solto e sem reparar a lesão que causou, podendo até, diante da demora do processo, deixar de ser punido.
A sensação justa dos menos afortunados será de que a pena só existe para os pequenos. Mais que a tentativa de reeducar o infrator, a punição guarda um traço pedagógico, servindo como desestímulo a quem não delinquiu. Desse modo, vendo-se o pequeno infrator punido pelo célere Juizado Especial e o grande livre, amparado pelos ritos processuais comuns, a recomendação será para que grandes crimes sejam cometidos.
Havendo juízes diferentes para julgar infrações supostamente diferentes, a tendência dos que somente lidam com as infrações de menor potencial ofensivo é ver nelas grandes delitos, passando a puni-los com todo o rigor; aqueles que apenas lidam com os grandes delitos, passarão a enxergá-los como fatos corriqueiros, passando a puni-los mais brandamente.
Não se pode viver a criar regras diferentes, leis de salvação, porque a nada conduzem, simplesmente deviam a atenção dos problemas maiores. O custo da montagem desses Juizados, com maior proveito, seria destinado a estruturar melhor a Justiça que existe, que funciona de modo precário, atulhada de processos, escassamente mecanizada, mal instalada e servida por funcionários que têm no descontentamento seu traço comum.
Já é hora não de leis diferentes, mas de Justiça igual para todos, ricos, pobres, pequenos e grandes infratores e isso o Brasil ainda está a nos dever.

CLITO FORNACIARI JÚNIOR, 44, advogado, é mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Foi presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (1993-94).

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