São Paulo, terça-feira, 7 de novembro de 1995
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Em nome do ódio

Dificilmente um evento internacional, mesmo marcado com meses de antecedência, teria conseguido reunir tantos chefes de Estado, governo e monarcas. Quando se considera que tudo foi organizado em menos de 48 horas, tem-se uma medida do empenho dos líderes do planeta na manutenção do processo de paz no Oriente Médio. A presença maciça desses líderes nos funerais do premiê israelense Yitzhak Rabin é o retrato desse empenho.
Mais importante, porém, foi constatar que não havia apenas quipás judaicas nas cerimônias, mas também alguns "keffieh", o turbante quadriculado típico de palestinos e outros povos da região.
Com efeito, sete países árabes mais a Autoridade Nacional Palestina enviaram representantes a Jerusalém, incluindo o rei Hussein, da Jordânia, e o presidente Hosni Mubarak, do Egito. O significado político de um líder árabe pisar em Jerusalém é mais ou menos o equivalente de um presidente americano ser recebido por Fidel em Cuba.
O próprio Iasser Arafat considerou a hipótese de ir a Jerusalém, mas desistiu por questões de segurança e por temer que a sua presença gerasse manifestações contrárias da direita israelense.
Todos os seis países do Conselho de Cooperação do Golfo condenaram o assassinato, embora nem todos tenham enviado representantes. O mesmo comportamento tiveram o Líbano e a Argélia. Mesmo a imprensa iraquiana, controlada pelo intempestivo Saddam Hussein, foi surpreendentemente objetiva em seu noticiário. A Síria nada declarou, mas há informações de que Hafez al Assad desaprovou a ação. Oficialmente, apenas a imprensa Líbia e a do Irã disseram que a morte de Rabin era muito bem-vinda.
Para além de Estados e nações, o atentado contra o premiê israelense foi particularmente festejado por militantes muçulmanos do Líbano e da Jordânia e, pasme, por judeus ultra-ortodoxos nos territórios ocupados e em Nova York. Eis aí a prova cabal de que o fanatismo e a intolerância não têm pátria nem religião, embora estes sejam os pretextos mais comuns para as ações descabidas. Mesmo quando o mundo inteiro se une para celebrar um mártir da paz, há aqueles que, numa perversa aliança tácita, tudo farão para, em nome do ódio, fomentar a guerra.

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