São Paulo, sexta-feira, 10 de novembro de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Cuba vai a Miami em 'Tudo por um Sonho'
JOSÉ GERALDO COUTO
Produção: EUA, 1994 Direção: Mira Nair Elenco: Alfred Molina, Marisa Tomei, Anjelica Huston, Chazz Palminteri Onde: nos cines Paulistano, Olido 2 e Butantã 3 e Market Place 3 "Tudo por um Sonho" começa com a libertação de um preso político cubano, Juan Perez (Alfred Molina), e sua viagem num barco cheio de marginais para Miami, onde sua mulher, Carmela (Anjelica Huston), o espera há 20 anos. Só que, durante a viagem e no acampamento onde os recém-chegados são obrigados a ficar, Perez se aproxima de uma fogosa prostituta, Dottie (Marisa Tomei), que quer usá-lo como falso marido para facilitar sua entrada nos EUA. Nas mãos de Billy Wilder, esse argumento daria uma comédia sexy e corrosiva como "Beije-me, Idiota"; nas de Robert Wise, um musical moderno e movimentado como "West Side Story"; nas de Brian De Palma, um policial violento como "Scarface". Nas mãos da diretora de origem indiana Mira Nair, é um melodrama bastante banal, com pinceladas de comédia e musical. A oscilação entre os vários registros, que parece dominar a diretora em vez de ser dominada por ela, é fatal para o filme. Senão, vejamos. O acampamento dos refugiados cubanos em Miami é uma festa (danças, tenda de macumba, personagens exóticos), contrastando com a visão tenebrosa apresentada nos primeiros minutos do "Scarface" de De Palma. Essa colorida e ostensiva irrealidade só poderia sustentar uma comédia de erros (erros e coincidências não faltam no enredo) ou um musical extravagante. Para isso, contaria com a personagem caricatural da prostituta romântica e folclórica, que parece saída de um romance tardio de Jorge Amado. Mas esse potencial vôo do filme é freado pelo realismo comezinho do personagem de Perez e pela pretensão de seriedade da linha melodramática do entrecho. Esta, por seu turno, é repleta dos clichês mais batidos do gênero. Exemplos: Carmela Perez, cansada de esperar, arranja um namorado (Chazz Palminteri) justo quando está prestes a reencontrar o marido; a "prostituta de coração de ouro", que no princípio queria só usar Perez, se apaixona por ele de verdade, mas não quer perturbar sua felicidade doméstica. A esses clichês narrativos correspondem outros tantos clichês visuais. Quando Perez vê a mulher com outro, por exemplo, seu peito começa literalmente a sangrar. Nada contra o kitsch deliberado como meio de expressão, mas no contexto "realista" da cena a imagem é intolerável. Não por acaso, o personagem mais real e mais vivo do filme -um pivete cubano que se vira como pode nas ruas de Miami- é o único eliminado da trama. Curiosamente, o filme de estréia de Mira Nair, "Salaam Bombay", era sobre um "pixote" como esse. Ao emigrar para os EUA, Mira Nair -que depois realizou "Mississippi Massala"- foi progressivamente deixando a vida de lado e entrando na irrealidade do imaginário hollywoodiano. Só que sem o talento e a fantasia dos grandes diretores da América. Texto Anterior: Pastor merece estátua em praça pública Próximo Texto: Épico de Hong Kong perde-se na convenção Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |