São Paulo, sábado, 11 de novembro de 1995
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Grupos radicais palestinos aceitam diálogo de paz

OTAVIO DIAS
ENVIADO ESPECIAL À FAIXA DE GAZA

Grupos extremistas islâmicos como Hamas (Movimento de Resistência Islâmico) e Jihad (Guerra Santa) Islâmica aceitaram estabelecer um diálogo com a Autoridade Nacional Palestina, o que, na prática, revela aceitação do processo de paz conduzido por Iasser Arafat e pelo governo de Israel.
Entre os temas que começam a ser discutidos estão as eleições de janeiro nos territórios sobre administração da Autoridade Palestina e as bases políticas e sociais de um futuro Estado Palestino na faixa de Gaza e Cisjordânia.
Ontem, a reportagem da Folha visitou o escritório central de Iasser Arafat na cidade de Gaza. Ele fica numa casa ampla, mas bastante simples, de frente para o mar Mediterrâneo.
Fica óbvio que o processo de paz alterou de maneira radical o estilo de vida do dirigente da Organização pela Libertação da Palestina.
Foi-se o tempo em que ele vivia na clandestinidade, escondendo-se de casa em casa, protegido por intenso esquema de segurança.
Agora todos sabem que Arafat está lá, em seu escritório. Ontem, ele recebeu um representante do governo da República da Eslovênia e participou de diversas reuniões.
Os dias do principal líder do povo palestino ficaram mais conturbados após o assassinato do premiê de Israel Yitzhak Rabin, há uma semana. Seu conselheiro e porta-voz, Marwan Kanafani, falou à Folha.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Folha - O processo de paz no Oriente Médio parece entrar em uma nova fase com as negociações entre a Autoridade Nacional Palestina e o grupo extremista islâmico Hamas. Que acordo está se buscando?
Marwan Kanafani - Não são negociações, mas um diálogo. Estamos conversando não apenas com o Hamas, mas com todos os partidos, organizações e instituições, mesmo aquelas que estão fora de nossa coalizão.
O objetivo é chegarmos a um entendimento em relação ao futuro do processo de paz e do Estado Palestino, de maneira a permitir que todos nós participemos das eleições e do governo do Estado que estamos tentando estabelecer.
Folha - O diálogo pode levar ao fim do emprego de violência por parte de organizações como Hamas e Jihad?
Kanafani - Nosso objetivo é garantir uma vasta participação dos palestinos no governo. A violência que tem ocorrido é ilegal, não faz parte do jogo político.
Nós não vamos tolerar nenhuma violência, seja contra os palestinos ou contra israelenses. Mas não estamos dialogando para parar a violência. Estamos dialogando para convencê-los de que todos temos de estabelecer um campo de entendimento sobre como governar e a como participar do estabelecimento do sistema político palestino, especialmente no que diz respeito às eleições que teremos em dois meses.
Folha - O Hamas autorizou seus simpatizantes a se registrar como eleitores para as eleições de janeiro. Este é um passo no reconhecimento da Autoridade Palestina?
Kanafani - É um sinal objetivo e positivo. Eles querem fazer parte do sistema político. Nós apoiamos isso e queremos que eles participem das eleições, queremos que seus membros sejam eleitos. É como entendemos a democracia.
Folha - Os srs. receiam que o Hamas obtenha grande quantidade de votos nas eleições?
Kanafani - Algumas pessoas acham que eles terão, outras que não. O único jeito de saber é por meio das eleições.
O presidente Iasser Arafat e a Autoridade Palestina respeitarão o desejo do povo palestino, independentemente do resultado.
Folha - O assassinato do primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin estreitou os laços entre a Autoridade Palestina e o governo israelense?
Kanafani - Não iria tão longe, mas abriu os olhos de ambos os lados e nos ensinou a lição de que a violência é contagiosa e pode ser exercida com palavras e não só com balas.
Temos de ter muito cuidado com aqueles que lutam contra a paz não apenas com balas, mas com declarações que ajudam a disseminar a violência.
Folha - A morte de Rabin foi comemorada em Gaza?
Kanafani - É claro que muitas pessoas celebraram o atentado. Rabin não era um santo, ele era um general que causou a morte de muitos palestinos, a destruição de muitas casas. Muitos palestinos o vêem desta maneira.
Por outro lado, era um homem que queria atingir a paz. Não me surpreende que algumas pessoas em Gaza ou no Líbano tenham festejado sua morte. Eu entendo isso, embora condene. O que me surpreendeu foram as comemorações que ocorreram em Israel.
Folha - Qual foi o significado da visita do presidente Arafat a Leah Rabin, viúva de Rabin, na noite de quinta-feira?
Kanafani - Foi um gesto puramente humanitário. Arafat achou que devia apresentar suas condolências à viúva pessoalmente.
Folha - Foi sua primeira visita a Israel desde 1967...
Kanafani - Sim, mas não foi uma visita política a Israel, e sim um ato de respeito, consideração e carinho. Quando o presidente for a Israel, ele irá à luz do dia, com todas as bandeiras e câmaras. Ele não tem vergonha ou timidez.

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