São Paulo, domingo, 12 de novembro de 1995
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Bolsas fazem muito barulho por nada

MILTON GAMEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Barulhentos por natureza, os pregões das Bolsas de Valores ecoaram por todo o país, na semana passada, quando se cogitou -e se enterrou- a hipótese de tributação dos investimentos estrangeiros em ações.
Enquanto o organizado lobby das Bolsas tentava demover o governo da idéia, operadores paulistas e cariocas chegaram a fazer uma greve-relâmpago, de dez minutos, horas antes de ser anunciada a decisão de se manter tudo do jeito como está, na terça-feira.
O episódio teve o mérito de revelar duas facetas contraditórias do mercado de capitais brasileiro: sua importância para o futuro e sua irrelevância no presente.
Na teoria, as Bolsas são fundamentais para o futuro do Plano Real, pois representam o meio mais barato de as empresas buscarem recursos para novos investimentos -premissa básica de um desenvolvimento auto-sustentado.
Na prática, porém, as Bolsas são hoje insignificantes em termos macro-econômicos, pois movimentam um volume pífio de recursos (menos de R$ 200 milhões por dia), em negócios concentrados em poucas ações de estatais.
"O mercado de capitais brasileiro é muito pequeno para o tamanho do país. Terá de ser desenvolvido, pois as empresas vão precisar das Bolsas para crescer", admite Álvaro Augusto Vidigal, presidente da Bovespa, a maior do gênero no país.
Os números provam a pequenez das Bolsas nacionais. Nos cálculos da Lafis (Latin American Financial & Investment Services), o volume anual de ações negociado no país alcança apenas 17% do PIB (soma de produtos e serviços), contra 41% na Argentina, 24% no México, 58% nos Estados Unidos e 300% em Taiwan.
Somente a Bolsa de Nova York, a maior do planeta, negocia diariamente US$ 12 bilhões, 60 vezes o volume brasileiro, embora o PIB americano seja apenas cerca de 11 vezes maior que o do Brasil.
O país conta com apenas 857 empresas de capital aberto, das quais centenas só se tornaram públicas por casuísmo (para captar recursos esporadicamente por meio de debêntures, por exemplo), e não para buscar sócios nas Bolsas.
Este ano, até outubro buscaram dinheiro nas Bolsas apenas 25 empresas, que captaram R$ 1,66 bilhão com emissões de ações. Outras 117 companhias recorreram ao mercado de capitais para levantar R$ 5,7 bilhões em debêntures simples e conversíveis.
"É muito pouco para um país que está no limiar de um novo ciclo de desenvolvimento", observa o presidente da CVM, Francisco da Costa e Silva. "Para mudar esse quadro, é preciso estimular a formação de poupança interna e também fazer com que os empresários incorporem realmente a cultura do capital aberto."
A formação da poupança interna é fundamental para o deslanchar das Bolsas, pois sem recursos de longo prazo não se obtém o desenvolvimento sustentado, explica.
Nesse contexto, a reforma da Previdência é que vai dar o tom do crescimento do mercado de capitais no país, uma vez que serão criados mecanismos de incentivo à previdência privada, acrescenta Rubens Marçal, diretor da Lafis.
"Ganhamos uma batalha ao cair a proposta da tributação ao capital estrangeiro, pois sem ele não temos liquidez suficiente para crescer. Agora, temos que alavancar nosso próprio capital de longo prazo", diz Marçal.

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