São Paulo, sexta-feira, 17 de novembro de 1995
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Prêmios têm mais critérios políticos que estéticos

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

Festivais nacionais de cinema costumam fazer média, mas desta vez o júri de Brasília exagerou.
As contradições da premiação são evidentes, a sugerir que a decisão resultou muito menos de uma avaliação isenta dos filmes que de uma negociação política entre panelas, grupos regionais e, por último, concepções de cinema. Como explicar de outro modo que o filme escolhido como o melhor -"O Judeu"- não tenha nem a melhor direção, nem o melhor roteiro, nem os melhores atores, nem a melhor fotografia? A direção de arte de Adrian Cooper é de fato fantástica, mas será ela, sozinha, responsável pela escolha?
Alguns prêmios, inventados para fazer média, chegam a ser ridículos, como o de melhor documentário para o excelente "No Rio das Amazonas", único documentário na competição.
Não é impossível que, numa próxima edição, o festival confira um Candango ao "melhor melodrama sobre prostitutas rodado em preto-e-branco na cidade de Osasco" se isso for necessário para equilibrar o jogo político do júri.
Outro prêmio de consolação foi o esdrúxulo "melhor contribuição para a linguagem cinematográfica", conferido a "O Mandarim".
Não é casual que o único longa a não ganhar nada tenha sido "Enredando as Pessoas". O filme -uma colagem enfadonha de experiências com a manipulação eletrônica da imagem- teria certamente entrado na festa da banana da premiação se seu diretor, Eder Santos, não fosse um "outsider" proveniente da vídeo-arte.
O mesmo corporativismo explica a rejeição do belo curta "Lá e Cá", da videomaker Sandra Kogut, por um festival que premia, por motivos geopolíticos, o pernambucano "Maracatu Maracatus", infinitamente inferior. Assim como ocorreu entre os longas, um dos melhores curtas, "Caligrama", de Eliane Caffé, recebeu o prêmio de consolação de "melhor documentário", quando nem documentário propriamente é.
Nessa comédia de erros, é lícito supor que os eventuais acertos, como o prêmio de roteiro para "Dezesseis Zero Sessenta" ou o de direção de arte para "O Judeu", ocorreram por acaso.
O Festival de Brasília espelha a cidade em que se realiza. Enquanto a política brasileira for marcada pela improvisação, pela falta de seriedade e pelo conchavo, o festival vai ter a mesma cara.

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