São Paulo, sábado, 18 de novembro de 1995
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Escuta telefônica derruba assessor de FHC

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O diplomata Júlio César Gomes dos Santos, 55, foi exonerado da chefia do Cerimonial da Presidência sob suspeita de exercer tráfico de influência em negociações relacionadas ao projeto Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia).
O Planalto manteve sua indicação para a embaixada brasileira no México.
A PF (Polícia Federal) fez escuta no telefone da na casa de Júlio César. A transcrição das fitas foi apresentada a FHC na última segunda-feira. A escuta foi feita mediante autorização judicial.
Uma das fitas registra diálogo de Júlio César com José Afonso Assumpção, dono da Líder Táxi Aéreo e representante da Raytheon, empresa norte-americana escolhida para fornecer os equipamentos do Sivam.
"Como vai, comandante, tudo bem?", inicia Júlio César. "Tudo bem. O problema é o Sivam", devolve Afonso Assumpção. "Aquele filho da puta do (senador) Gilberto Miranda está sacaneando, atrapalhando tudo. Ele não quer que o projeto saia".
Gilberto Miranda (PMDB-AM) é relator do projeto do governo que autoriza a obtenção de empréstimos externos de US$ 1,4 bilhão para a instalação do Sivam. Ele está em viagem oficial a países do Leste Europeu.
O diplomata Júlio César dá continuidade à conversa: "Porra, você já pagou para este cara?" E o representante da Raytheon: "Ele está atrapalhando, está colocando dificuldades".
A fita, obtida pela revista "IstoÉ", menciona também o nome do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).
Júlio César diz: "Tem que falar com o Sarney. Ele é que manda no Gilberto Miranda. O que ele fala o Gilberto faz".
Afonso Assumpção desdenha: "Ouvi dizer que o Sarney também é contra." Mas o diplomata insiste: "Deixa que eu falo com o Sarney. Eu vou à tarde no Senado e falo com ele. Pode deixar". Júlio César foi chefe do Cerimonial à época em que Sarney era presidente da República.
Ouvido, Sarney diz que o ex-auxiliar jamais o procurou para tratar do projeto do Sivam. Procurado em sua residência, em Belo Horizonte, Assumpção não foi localizado. Informou-se que estava viajando e voltaria segunda-feira.
O próprio Fernando Henrique determinou a investigação ao ministro da Justiça, Nelson Jobim, após ter recebido denúncias de integrantes do governo.
O porta-voz do Planalto, Sergio Amaral, disse que a indicação de Júlio César para o México foi mantida porque "o presidente não vê motivo que desmereça a confiança", disse Amaral.
"O embaixador Júlio César cometeu uma imprudência (nas conversas). Mas nos quase três anos em que trabalhou com o presidente não fez lobby nem praticou ato que possa significar interferência por interesses terceiros", disse FHC, segundo Amaral.
Júlio César assessora Fernando Henrique desde a época em que o atual presidente foi nomeado chanceler, na gestão Itamar.
Transferido para a pasta da Fazenda, FHC levou-o para sua chefia de gabinete. Como candidato à Presidência, designou-o para organizar suas viagens pelo país.
Há outra gravação em que Júlio César conversa com um amigo da empreiteira Andrade Gutierrez.
O conteúdo do diálogo diz respeito a uma concorrência a ser realizada no México, país para onde foi indicado como embaixador.
Segundo Sérgio Amaral, FHC soube do conteúdo das fitas na segunda-feira última. No dia seguinte, cobrou explicações do assessor. O diplomata teria pedido exoneração do cargo na quarta-feira.
Ontem pela manhã, Júlio César esteve no Planalto. À tarde, no Cerimonial, informava-se que havia viajado e que retornaria na terça-feira.

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