São Paulo, sábado, 18 de novembro de 1995
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Conceito de autoridade

ALVARO LAZZARINI

Chega de corporativismo!, no dizer de Bismael B. Moraes, ex-sargento da Polícia Militar de São Paulo e ex-delegado de polícia, no artigo Conceito de Autoridade (Folha, 11/11, p.3-2) em crítica ao meu Juizado Especial e Autoridade (Folha, 3/11, p.3-2). Respondo-lhe Chega de Classismo! Chega da tese de que só uma classe de servidores policiais civis tem autoridade policial, enquanto que as demais, civis ou militares, são seus simples serviçais. A crítica, só por isso, é inconsistente e faz lembrar a lição filosófica de Wittgenstein: "sobre aquilo que não se pode dizer nada, deve-se calar".
Bismael B. Moraes não percebe que o Código de Processo Penal no art. 4º, que invocou, não diz quem é autoridade policial. Não percebe que o parágrafo único do mesmo artigo é expresso no sentido de que "A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função de polícia judiciária. Trata-se de norma processual penal em branco a do referido art. 4º. O direito administrativo deve assim fornecer o conceito jurídico de autoridade policial, que é agente administrativo, para o exercício da atividade de polícia, que tem a legitimá-la o poder de polícia (Caetano, Marcelo. "Princípios Fundamentais de Direito Administrativo", p.335). Tal poder de polícia é capítulo do direito administrativo.
Bismael B. Moraes acerta ao dizer que devemos conhecer a "sistemática jurídica brasileira". Por isso lembro-lhe que a polícia, civil ou militar, é uma atividade jurídica do Estado e deve ter seus problemas solucionados à luz das ciências do direito e da administração pública. O conhecimento científico, abrangente de experiências diversas e sedimentado pelo tempo, representa caminho seguro na tomada de posição.
O direito é ciência e evolui. Muitos de seus conceitos modificaram-se, em especial aqueles tidos como normas em branco ou juridicamente indeterminadas: a própria noção de direito ou do que é justo varia de acordo com o tempo e espaço. Inconcebível, portanto, que o cientista do direito fique estancado no tempo, usando conceito de autoridade policial de 50 anos atrás e também parado no espaço porque não vê além do seu interesse classista.
Na organização policial deve haver hierarquia, que é definida como "O vínculo que subordina uns aos outros os órgãos do poder Executivo, graduando a autoridade de cada um (Masagão, Mário. "Curso de Direito Administrativo", nº.148, p.60). O policial ocupa uma posição na linha hierárquica. Daí o direito lhe reconhecer autoridade policial, decorrente de sua investidura legal. Para isso saber, basta conhecer a teoria dos agentes públicos (Lopes Meirelles, Helly. "Direito Administrativo Brasileiro", p. 75) ou a teoria dos servidores públicos (Bandeira de Mello, O.A. "Princípios Gerais de Direito Administrativo", v.2, nº.36, p.370). A autoridade decorre de estar ocupando cargo público na linha hierárquica policial, com atribuições próprias. Todo polícia é autoridade no sentido técnico-jurídico do terno (Cretella Júnior, José, RDA, v.162, p.33).
A Comissão Nacional de Interpretação da Lei 9.099/95, sob a coordenação da Escola Nacional da Magistratura também concluiu que a "a expressão 'autoridade policial' referida no art. 69 compreende quem se encontra investido em função policial"', tudo a demonstrar o desacerto da crítica de Bismael B. Moraes ora respondida.

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