São Paulo, domingo, 19 de novembro de 1995
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Mulher domina bytes e vence entre homens

PATRICIA DECIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando elas eram adolescentes, computador era coisa de ficção científica e informática se chamava cibernética. Por acaso -ou por destino- a máquina entrou na vida dessas mulheres ainda nos anos 70 e não saiu mais.
Hoje, não concebem o trabalho e a vida doméstica sem o teclado, o mouse e a Internet (rede mundial de computadores).
As "rainhas da informática" enfrentam um mercado ainda dominado pelos homens. Na IBM, onde trabalha a gerente Eleonora Campi, 41, apenas 9% dos cargos de chefia são ocupados por mulheres. Do total de funcionários, são do sexo feminino apenas 27%.
Na Microsoft, a porcentagem chega a 40%, mas apenas quatro dos 25 vice-presidentes da empresa no mundo são mulheres.
"O mundo da informática pode quebrar a barreira do sexo. Quando você está do outro lado do terminal, não perguntam o seu nome. É até meio impessoal, mas o que importa é realizar um trabalho com qualidade", diz Eleonora.
O começo da carreira, um emprego meio período na Prodesp, causou estranheza na família. "Por mais que eu falasse, minha mãe não conseguia entender com o que eu trabalhava". Isso aconteceu em 73, quando ela prestou vestibular (e passou) para o curso de física, abandonado no ano seguinte.
Dez anos depois, com a aquisição de um PC (computador pessoal), Eleonora não tinha olhos para mais nada. "Me aficionei. Durante cinco anos, ficava todo dia até 4h da manhã brincando com o sistema operacional. Isso me distanciou das pessoas, porque eu era mais apaixonada pela máquina do que por gente."
O fascínio pela lógica da máquina, o "como-funciona", foi o que levou a professora Marília Junqueira Caldas, 45, aos computadores (leia texto ao lado). Ela começou em 69, no primeiro curso de "Iniciação à Cibernética" do Instituto de Física da USP (Universidade de São Paulo).
Continuou na física e, para fazer ciência, não abriu mão dos vários recursos do computador.
"Se quero saber como um átomo se move dentro de um semicondutor cheio de átomos diferentes, preciso calcular (o que, sem o computador, é impossível). Depois, para entender o que calculei, uso a computação gráfica", diz.
Ela se denomina uma "usuária chata, aquela que reclama". Marília sempre se preocupou com a existência de um bom laboratório de computação científica na universidade.
Hoje, ela coordena o Centro de Computação Eletrônica da USP, o segundo cargo mais importante ligado à informática da universidade. O centro, entre outras coisas, é responsável pela Uspnet (o ramo da USP na Internet).
"Só consigo fazer esse trabalho porque tenho o apoio total da Comissão de Informática e da administração da universidade", diz.
Uma visita à TV Globo fez a engenheira eletrônica Lúcia Modesto, 40, abandonar os planos de fazer doutorado em eletrônica quântica para começar a trabalhar com computação gráfica, fazendo animação e efeitos especiais para vinhetas de televisão.
"Antes, eu detestava computador. De brincadeira, fazia desenho animado em casa. Quando recebi o convite, pensei: vou experimentar fazer isso. Estou aqui até hoje. Adoro o que faço, computação gráfica é muito divertido."
Como Marília e Eleonora, Lúcia também entrou na área quando a técnica era pouco elaborada.
"Meu aprendizado foi homeopático, porque, quando comecei, era só um sisteminha de pintura. Hoje, quem começa enfrenta muito mais dificuldade", diz.
As oito horas diárias que passa em frente à estação de trabalho são suficientes para ela. "Em casa, quem manda no computador é meu filho de 15 anos. De vez em quando, até jogo alguma coisa com ele", conta.

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