São Paulo, domingo, 19 de novembro de 1995
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Doutor no mal do século

VANESSA DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Condecorado há poucos meses como um dos dez melhores médicos dos EUA na área de Alergia e Imunologia, Arye Rubinstein chega ao Brasil hoje para um encontro que reunirá, até quarta-feira, pesquisadores brasileiros que desenvolvem pesquisas com Aids.
O médico, diretor do Centro de Pesquisas com Aids da Faculdade de Medicina Albert Einstein, em Nova York (EUA), é considerado um dos pioneiros da pesquisa de Aids em crianças.
Foi ele, por exemplo, o primeiro médico a descrever, em 1981, os sintomas da Aids em crianças (leia texto ao lado).
A importância de Rubinstein vai além do relato desses sintomas. O médico foi a primeira pessoa a tentar mostrar que a Aids não era doença exclusiva dos homossexuais. Até então, a doença recebia o nome científico de Grid (sigla para "Imunodeficiência Relacionada aos Gays"), ou como muitos chamavam, "câncer gay".
Trabalhos seus com orientação contrária chegaram a ser recusados por duas revistas científicas. Leia a seguir, os principais trechos da entrevista exclusiva concedida à Folha por fax.

Folha - Quando e por que o sr. começou a trabalhar com Aids?
Arye Rubinstein - Nosso envolvimento com Aids começou em 1978 com uma criança que apresentava infecções bacterianas recorrentes, muito antes de a Aids ter sido descrita. Somente em 1981 pudemos dizer que essa criança tinha Aids pediátrica. A história de nosso envolvimento é descrita no livro "The Band Played On", de Randy Shilts ("O Prazer com Risco de Vida", Ed. Record, 735 páginas).
Folha - Estudos recentes afirmam que um coquetel de drogas é mais eficiente do que o AZT sozinho. Mas o custo desses tratamento é muito alto. Como resolver esse problema de custo/benefício?
Rubinstein - Não há dúvida de que uma combinação de drogas reduz a resistência do vírus e que pode aumentar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida, mas os efeitos na longevidade ainda não foram determinados. Nenhum desses tratamentos é barato, e o custo/benefício determinam a viabilidade deles.
Folha - O sr. acha que programas como distribuição de preservativos e trocas de seringas são eficazes?
Rubinstein - Medidas preventivas são extremamente importantes, especialmente quando a cura ainda não está disponível. Medidas preventivas deveriam ser adotadas, e novas medidas desenvolvidas. Nós estamos, por exemplo, trabalhando numa espuma preservativa anti-HIV.
Folha - Que drogas que têm se mostrado promissoras?
Rubinstein - As novas drogas incluem inibidores de protease, combinação dessas drogas com hidroxiuréia etc. Esperamos que novas terapias, menos tóxicas, superem alguns dos problemas da resistência às drogas.
Folha - Artigo recente na revista "Nature" diz que o HIV continua com poder de destruir células do sistema de defesa mesmo quando cercado de anticorpos. O HIV é imbatível?
Rubinstein - A morte do HIV se deve a fatores humorais (relacionada aos líquidos corpóreos) e celulares. Ainda não está claro o papel da imunidade humoral na eliminação do vírus no plasma sanguíneo. Alguns pacientes têm anticorpos neutralizadores, outros não. A transmissão do HIV da mão ao bebê, por exemplo, diminui na presença de anticorpos neutralizadores ao vírus.
Folha - A Ásia já ultrapassou a África em número de casos novos. Como o sr. vê a Aids em países pobres?
Rubinstein - O Terceiro Mundo está se tornando o maior contribuinte para a epidemia de Aids. Entretanto temos a incumbência de concentrar nossos esforços em medidas preventivas que visem brecar a epidemia no Terceiro Mundo.
Folha - Qual a sua expectativa com relação a essa visita ao Brasil?
Rubinstein - Espero estreitar relações com pesquisadores brasileiros e, em última instância, embarcar em colaboração científica. Novas terapêuticas e modalidades preventivas provavelmente podem ser testadas mais rápida e eficazmente no Brasil.

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