São Paulo, domingo, 19 de novembro de 1995
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Rumo à evolução científica

JOSÉ ISRAEL VARGAS
ESPECIAL PARA A FOLHA

A Folha de 5/11, à página 5-3 do caderno Mais!, publicou texto assinado pelo professor e pesquisador Ivan Izquierdo, sob o título "Artimanhas do Duplo Discurso", que está a merecer alguns reparos.
Refere-se o professor Izquierdo a discurso do presidente Fernando Henrique Cardoso por ocasião da entrega de prêmios a cientistas destacados, em que anunciou a intenção de criar condições para duplicar o esforço nacional em atividades de ciência e tecnologia durante o seu mandato. Este "esforço nacional soma todos os gastos em ciência e tecnologia realizados no país, seja pelo governo federal -em diversos ministérios-, pelos governos estaduais e municipais, seja pelas empresas -públicas e privadas-, e corresponde, hoje, a cerca de 0,7% do PIB. O programa do governo Fernando Henrique Cardoso, consolidado no chamado Plano Plurianual 1996 a 1999, prevê aumentar a participação relativa do setor de ciência e tecnologia para 1,5% nesse período.
Trata-se, pois, não só de ampliar as dotações orçamentárias do Tesouro Nacional, mas também -e principalmente- de induzir as empresas dos setores agrícola, industrial e de serviços a investirem em pesquisa e desenvolvimento. Esse segmento é prioritário, pois representa hoje algo em torno de 10% do "esforço nacional em ciência e tecnologia -participação absurdamente baixa se comparada à praticada em países industrializados (nos quais as empresas arcam, em média, com 50% dos gastos nacionais em ciência e tecnologia).
Mais do que uma vontade política, o investimento de empresas em pesquisa e desenvolvimento é imperioso para a sobrevivência delas -expostas à competição internacional, em que qualidade, produtividade e baixos custos conseguidos graças à melhoria tecnológica são as principais ferramentas para a ocupação de mercados.
As leis de incentivos fiscais para ciência e tecnologia em empresas (lei nº 8.248/93, de informática, e lei nº 8.661/93, para indústria em geral) vêm apresentando resultados interessantes. Ao todo, foram contratados até agora projetos no valor global de cerca de R$ 1,2 milhão. Somente na área de informática, isto representa injeção de recursos novos para a pesquisa no valor de R$ 300 milhões por ano -R$ 100 milhões dos quais obrigatoriamente aplicados em universidades e centros de pesquisa. Nos demais setores, os projetos já contratados têm duração média de quatro anos -significando investimentos anuais novos em ciência e tecnologia no valor de R$ 200 milhões.
Embora os resultados sejam animadores, ainda estamos lidando com poucas empresas -cerca de 300, em um universo total estimado em 1 milhão de empresas. Se considerarmos que cerca de 1.000 empresas no país já conseguiram o certificado de qualidade segundo as normas ISO 9000 -uma espécie de passaporte para os mercados mais sofisticados- e o número de novos certificados cresce à taxa de 50 empresas por mês, temos razoável avaliação das potencialidades dessas leis de incentivos fiscais.
Para a realização de seus projetos de pesquisa e desenvolvimento, essas empresas recorrem à infra-estrutura laboratorial e humana existente em universidades e centros de pesquisa, principalmente governamentais. Ao todo contabilizam-se quase 100 instituições de pesquisa já envolvidas com projetos de interesse da indústria.
Além dessa injeção de novos recursos nas áreas de ciência e tecnologia, há que se considerar que as dotações orçamentárias federais para o setor também vêm sendo crescentes -a uma taxa média de 10% ao ano, de 1993 para cá. A proposta orçamentária do Ministério da Ciência e Tecnologia, para 1996, encaminhada ao Congresso Nacional, também propõe crescimento, em relação à proposta original para 1995, de cerca de 15%.
Além disso, o Ministério da Ciência e Tecnologia acaba de acertar com o Banco Interamericano do Desenvolvimento empréstimo no valor de US$ 160 milhões -ao qual o governo adiciona contrapartida de igual valor-, a ser desembolsado nos próximos três anos. Outro empréstimo -esse com o Banco Mundial- está em negociação, prevendo-se a possibilidade de acesso a novos U$ 600 milhões a partir do fim do próximo ano.
Cabe registrar ainda que os governos estaduais, dentro de suas limitações, buscam destinar recursos ao setor de ciência e tecnologia, passando a honrar dispositivos constantes de suas respectivas constituições -o que, salvo as honrosas e raras exceções, não faziam no passado.
Enfim, as ações necessárias ao cumprimento da proposta do presidente Fernando Henrique Cardoso, no sentido de dobrar a participação relativa da ciência e tecnologia no prazo de seu governo, estão em curso, e encaramos com otimismo a possibilidade de atingimento dessa meta.
É evidente que este aumento de dotações não poderia ocorrer por um passe de mágica, instantaneamente.
A leitura do texto do professor Izquierdo revela uma confusão entre orçamento -intenção- e verbas -dinheiro efetivamente disponível. De fato, as liberações de recursos do Tesouro Nacional, embora crescentes, ainda sofrem das dificuldades decorrentes do esforço de estabilização econômica e do necessário equilíbrio das contas governamentais.
Mas também nessa área registraram-se grandes progressos. Em 1992, para um orçamento de US$ 800 milhões, o Ministério da Ciência e Tecnologia conseguiu receber efetivamente apenas US$ 400 milhões. Em 1994, para um orçamento de US$ 1,2 bilhão, o ministério recebeu de fato cerca de US$ 1 bilhão. O orçamento de 1995 -ainda em execução- chegou a mais de R$ 1,2 bilhão, e nossa expectativa é de que possamos receber e aplicar de fato cerca de R$ 1 bilhão.
É pouco, é claramente insuficiente, mas os recursos são crescentes -em moeda constante-, muito além da inflação do Real e do crescimento do PIB. Certamente crescem na medida da capacidade de absorção dos recursos para apoio aos bons projetos de pesquisa, adequadamente estruturados e orçados.
Esses são, enfim, os esclarecimentos que julgo necessário prestar à sociedade e, em especial, à comunidade científica.

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