São Paulo, domingo, 19 de novembro de 1995
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"Ninguém ri da alegria, só das desgraças"

SÉRGIO DÁVILA; ARMANDO ANTENORE

Débora: É, sim, ele que falou que nós formamos panelinha!
Fernanda: Vai ser publicado e ele vai ficar chateado com você.
Débora: Deixa, depois eles botam entre parênteses "Risos". (Risos)
O problema pode ser porque vocês ocupam um espaço muito grande.
Diogo: É bom existir essa panelinha. Mas não de uma forma antipática.
Fernanda: Do jeito que vocês falam, parece que é coisa dos atores, uma regra. Não há um contrato, só que as pessoas se entendem. Paranóia!
Débora: A gente quer ser uma turma, não uma panelinha.
Fernanda: Há algo pejorativo na palavra panelinha, exclui outras formas de ser. Aqui, tem muito mais uma afinidade do que uma exclusão.
Diogo: E a gente rala, a gente produz, a gente vai à luta.
Já que todos estão com as vaidades tão resolvidas, quem responde qual é o melhor ator entre os cinco?
Diogo: É o Luiz.
Fernanda: Ele é o nosso ídolo, né?
Luiz Fernando Guimarães: Não, não, é o Diogo.
Débora: É a Fernanda.
Fernanda: É a Débora.
E o Miguel Magno?
Miguel: Sou eu.
Diogo: Vou fazer umas comparações. O Miguel é o nosso Ugo Tognazzi. O Luiz Fernando seria...
Fernanda: É o nosso Roberto Carlos! Gente, ele é ídolo. O Luiz Fernando é diferente. Ele é o nosso John Cleese! Ele entra em cena, a platéia cai na risada.
Essa peça é besteirol?
Luiz: Está dentro do gênero. Porque, na origem, o besteirol definia a peça com esquetes. Se falarem que é besteirol, não está errado.
E não é pejorativo?
Luiz: Pejorativo nada.
Miguel: Acho inadequado.
Diogo: No começo dos anos 80, os autores ficavam arrasados, resumia a dramaturgia deles numa besteira.
Débora: É pejorativo. Você associa um tipo de trabalho a uma besteira. E são dramaturgos maravilhosos, grandes autores brasileiros. Foram rotulados injustamente, diminuídos.
Miguel: O Ricardo de Almeida, que era meu parceiro, dizia que, se ele fazia alguma coisa, era inteligentol.
Fernanda: O princípio está no nosso espetáculo.
Miguel: Na época que surgiu o termo, falavam que a gente não tinha fôlego para fazer uma peça com unidade de ação, tempo e espaço. Isso é uma reinvidicação superacadêmica.
Por que você escolheram comédia, por que não um drama?
Luiz: Não vejo o menor sentido. Nunca me passou pela cabeça fazer drama. Também não penso se vai ser engraçado ou não o que eu faço. Mas tenho uma atração pela comédia. Olhando um texto, inconscientemente tento tirar leite de pedra, puxar o humor, por mais amargo que possa parecer.
Mas não incomoda entrar no palco, não fazer nada e já começarem a rir?
Luiz: Não, isso é resultado de muito tempo de trabalho.
Fernanda: Isso é um encanto, pô!
Luiz: Não pode me incomodar, é uma coisa boa. Se fosse inconsciente, eu não trabalhasse para isso, tipo chegar numa festa e todo mundo olhar para minha cara e começar a rir, aí acho que teria problemas. Mas não teria sentido de outra forma.
Fernanda: Tem gente que acha que eu tenho humor e outros pensam que eu sou densa. Outro dia, um jornalista me disse: "Você é conhecida pelo prêmio em Cannes e o público acha que você não tem humor. Como é estar fazendo essa peça?" Eu falei: "Você está me dizendo que o público acha que eu sou densa?" Ele disse: "É, o público acha". Eu falei: "Que bom, gente, ele sabe o que o público inteiro acha!"
Miguel: Tem sempre uma tendência de falar que fazer comédia é fácil. Eu não sei se a gente tem cara de palhaço... Fazer comédia é muito difícil.
Fernanda: Eu não sei se eu quero ver o Luiz num drama, por exemplo, mas outro dia eu falava para ele: "Luiz, tem algo violento em você que pode ser legal de trabalhar".
Luiz: Mas eu sou muito violento. Quanto a ser denso, o Diogo é a pessoa mais densa, angustiada que eu conheço. E ele transforma isso. A cena dele na peça é de uma intensidade, uma coisa horrorosa. E vira comédia. Um ator é um ator. Por que, na hora de fazer graça, você vira comediante e deixa de ser ator?
Fernanda: Isso não é tão claro para mim, se eu estou para lá ou para cá. Já fiz tanto comédia quanto drama.
Você fez inclusive "Selva de Pedra".
Fernanda: É, "Selva de Pedra", que foi a maior comédia, a maior pagação de mico da história da TV brasileira. Aquilo me deu muito humor.
Afinal, quais os planos que estão surgindo dessa convivência?
Fernanda: Projetos de cinema...
Cinema?
Fernanda: No cinema, sempre os diretores que te convidam. Eu adoraria inverter isso. Como no teatro: você acha uma peça e convida um diretor. Nós estamos com um elenco maravilhoso, temos de aproveitar. O cinema brasileiro tem uma herança glauberiana de que o diretor é o pensador-mór e os atores são escolhidos. A gente quer inverter.
Débora: É, não ficar tão passivo, esperando um projeto bater à porta.
Fernanda: Tem uma coisa louca com as mulheres, porque a maioria dos filmes é sobre homens. E a Débora falou "Pô, Nanda, eu vi 'Telma e Louise', é tão legal, a gente podia fazer uma versão brasileira".
Há divisão entre meninos e meninas?
Débora: As meninas ficam num camarim, os meninos em outro.
Fernanda: (Irônica) É, eu relutei muito para aceitar isso.
E alguém fez exigências absurdas, como pedir 20 toalhas pretas, sabonetes com cheiro de madeira?
Débora: Quem dera nós tivéssemos 20 toalhas...
Miguel: A única exigência era não separar, deixar cada um sozinho.

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