São Paulo, segunda-feira, 20 de novembro de 1995 |
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Educação e cidadania
PAULO RENATO SOUZA; IARA PRADO A valorização do magistério há de ser a base para toda a mudança do sistema escolar no BrasilPAULO RENATO SOUZA e IARA PRADO O processo de transição democrática no Brasil teve na promulgação da Constituição de 1988 um de seus momentos mais decisivos. O texto ali aprovado, contudo, não estabelece, por si só, o Estado democrático. De certa forma é o projeto de uma ponte entre o fim do período autoritário e a plena democracia, projeto arquitetado pelos constituintes, a partir da discussão e dos avanços históricos obtidos até então. Após os traumas e reordenações de um período inicial, a construção efetiva dessa ponte é inadiável. À Educação está entregue um dos papéis mais decisivos nessa empreitada, porque deverá atender, a um só tempo, necessidades imediatas e prementes, e o estabelecimento de mudanças estruturais. Hoje, existe uma dissonância entre uma legislação em vigor que não guarda relação alguma nem com a proposta da Constituição, nem com a do governo, agravada quando constatamos que o tempo acirrou as dificuldades com que lida a escola no Brasil. Nesse sentido, eleger o ensino fundamental como prioridade nacional é a escolha necessária, quando se pensa em atingir mudanças estruturais. Ao lado das responsabilidades do Poder Legislativo, que deverá deliberar sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, cabe ao Poder Executivo encaminhar propostas de trabalho que mudem a atual configuração da escola no Brasil. Para tanto, a valorização do magistério há de ser a base sobre a qual se estruture toda a mudança do sistema escolar no Brasil. De fato, ser professor, no Brasil, há muito deixou de ser atraente -e sem professores não se constituirá plenamente a verdadeira democracia. Tal valorização inclui a implementação de políticas de formação, capacitação, atualização, salários condignos, condições de trabalho, como há tanto reivindicam entidades do magistério, e iniciativas que já estão em andamento, através da reformulação de mecanismos de financiamento que deverão induzir essa valorização. Outro eixo dessa transformação encontra-se na definição de Parâmetros Curriculares Nacionais. Tal proposta volta-se à apresentação de diretrizes de ação que, superando a atual fragmentação das ações educativas, possam garantir a generalização, no país, de orientações condizentes com o avanço dos conhecimentos no mundo contemporâneo e afinadas com o cultivo dos valores culturais que nos são próprios. Essa definição incorpora, também, reivindicações de movimentos sociais de amplo, responsável e profundo significado histórico, como aqueles envolvendo as comunidades de origem africana, indígenas e outras minorias que terão assegurado o direito à proteção e promoção de suas identidades e tradições. Os próprios compromissos assumidos pelo Brasil na Conferência Mundial de Educação para Todos, em Jomtien, os quais levaram o Brasil à elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos (1993-2003), por um lado encaminham a eleição de prioridades e, por outro, compõem-se com outros compromissos igualmente assumidos em nível internacional, com a assinatura de pactos e convenções, em particular no que se refere aos Direitos Humanos. Esse tema, que o governo já vem trabalhando de maneira sistemática e prioritária em outras áreas, terá o lugar que lhe é devido na Educação. Proximamente, o MEC apresentará a versão preliminar dos Parâmetros Curriculares Nacionais, a ser submetida a amplo debate nacional, após o qual se configurará sua versão definitiva. O motivo por que o fazemos nesta semana é que se comemora pela primeira vez o Dia Mundial da Tolerância, em 16 de novembro, no Cinquentenário das Nações Unidas, bem como o tricentenário da morte de Zumbi, líder dos Palmares, na data especial de 20 de novembro. Assim, nesse entrelaçamento nacional e internacional de efemérides, assumimos a responsabilidade, pela primeira vez na história deste país, de uma proposta curricular que se estrutura em torno dos eixos da cidadania e da ética, como fundamentos indissociáveis na formação do aluno. Tal iniciativa contempla explicitamente, pela primeira vez, objetivos, conteúdos, orientações didáticas voltadas para a temática da solidariedade, da justiça, do respeito, da dignidade, valorizando o diálogo como forma de solução de conflitos e de tomada de decisões coletivas e desenvolvendo atitudes de repúdio às injustiças e discriminações. Sem dúvida o desafio de desenvolver, na prática, essa proposta será tarefa a ser assumida em conjunto com as secretarias estaduais e municipais de Educação, com as universidades, com os conselhos estaduais de Educação e com os órgãos representativos do magistério. PAULO RENATO SOUZA, 50, é ministro da Educação e do Desporto. IARA PRADO, 49, é secretária do Ensino Fundamental do Ministério da Educação e do Desporto. Texto Anterior: ESPÉCIE EM EXTINÇÃO; TUDO EU; FRENTE DE TRABALHO Próximo Texto: Zumbi é Palmares Índice |
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