São Paulo, quarta-feira, 22 de novembro de 1995
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Nivelamento por baixo

IVAN VALENTE

O governo enviou recentemente ao Congresso a sua proposta para ensino fundamental. Assim, ganha maior concretude o que até aqui tem sido mais marketing.
O projeto centraliza em Fundos Estaduais de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e da Valorização do Magistério (o governo não diz por quem e como serão geridos esses fundos) 60% das receitas de Estados e municípios constitucionalmente vinculadas à educação (fundamentalmente 25% do Fundo de Participação dos Estados, do Fundo de Participação dos Municípios e do ICMS), estabelecendo uma subvinculação de 3/5 desses recursos para pagamento dos professores.
Os outros dois pilares fundamentais da proposta governamental são: a fixação do gasto mínimo anual de R$ 300,00 por aluno matriculado nesse nível de ensino e o estabelecimento, em vez de um piso nacional profissional para os professores, de um salário médio de R$ 300,00 para os docentes, com jornada de 20h mais quatro horas de atividade extra-classe.
Além disso o governo introduziu várias emendas objetivando quebrar a autonomia universitária e romper o princípio da gratuidade do ensino em estabelecimentos oficiais.
Nos limites deste espaço, o que podemos assinalar é que as premissas e soluções da proposta são aquelas indicadas pelo Banco Mundial: municipalização do ensino, a preponderância de variáveis quantitativas na definição das políticas e desvinculação da política educacional de um projeto de nação.
Esse projeto retrocede frente às reais necessidades da educação e ao que já dispõe a própria Constituição. O problema é fundamentalmente de insuficiência e não de má gerência de recursos. No país o dispêndio público anual tem sido menos de 4% do PIB, gasto bem menor do que o de países como a Líbia ou o Quênia que gastam, respectivamente, 9,6% e 6,4% do PIB.
O projeto desobriga a União de liderar o financiamento para a erradicação do analfabetismo e a universalização do ensino médio (art. 60 das disposições transitórias da Constituição) e opera no sentido de sucatear o ensino médio e de desmontar as redes de ensino pré-escolar e infantil, nivelando por baixo os recursos a serem gastos entre as redes estaduais e municipais.
O custo mínimo anual fixado pelo governo em R$ 300,00 por aluno (R$ 25,00 por mês!) não sustenta nenhum projeto consistente de melhora da qualidade do ensino. E a indicação de um salário médio -e não o piso profissional- não favorece à reversão da situação de desestímulo dos profissionais.
É por essas e outras razões que esse projeto não sinaliza um caminho novo e positivo para a educação brasileira.

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