São Paulo, sábado, 25 de novembro de 1995
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Mais suave, precurssor do punk dedica disco a Paris

LUCY NEEDHAM
ESPECIAL PARA A FOLHA

Disco: "Paris"
Artista: Malcolm McLaren
Gravadora: RGE/Paradise
Quanto: R$ 18 (o CD, em média)

Que fim levou Malcolm McLaren? O homem que esteve na vanguarda de muitos dos mais brilhantes e controvertidos movimentos da cultura pop das últimas duas décadas. O homem que concebeu, mexeu os pauzinhos e infundiu novo significado à expressão "marketing" de produtos com os Sex Pistols. Que, ao lado de sua ex-mulher Vivienne Westwood, enfiou alfinetes em camisetas rasgadas e as vendeu em "Sex", a primeira loja de moda punk em Londres.
Seu histórico é impressionante -bandas revolucionárias e músicos como Boy George, Adam and the Ants e Bow Wow Wow foram descobertos, manipulados e tiveram contratos generosos negociados por ele.
Agora, depois de vários anos tentando vender -sem sucesso- roteiros em Hollywood, McLaren reaparece com o disco "Paris", dedicado à própria cidade. Na capa do disco ele declara seu afeto profundo por Paris, onde várias vezes se refugiou quando as coisas ficaram difíceis na ressaca do final dos anos 70 e início dos 80.
O disco se lê um pouco como uma viagem pela alma da cidade, com muitas referências ao jazz e a figuras francesas cruciais -Serge Gainsbourg, Eric Satie. É linear -quase como se fosse uma trilha sonora esperando por seu filme.
Entre seus participantes figuram (pasme!) Catherine Deneuve e Sonia Rykiel. Fotos chiques de Jean Baptiste Mondino retratam Paris e McLaren, que lembra mais um executivo elegante do que o "enfant terrible" que tem fama de ser.
O disco tem alguns problemas: é um tanto autocomplacente, e McLaren não é um músico nato -parece que ele não sabe cantar. Resultado disso é que muitas das canções são mais faladas do que cantadas, e os temas recorrentes de jazz, Miles Davis, marcos parisienses e símbolos eróticos, que reaparecem em todas as canções, acabam cansando um pouco.
Muito bem produzido, o álbum abre como um "groove" erótico, "Mon Dié Sénie", que não estaria deslocado num álbum de Madonna. "Paris Paris", cantado por Catherine Deneuve, é uma das músicas mais líricas e vale a pena ser ouvida, mesmo que seja apenas por curiosidade.
"Je t'aime... moi non plus" é uma decisão arriscada para um versão cover. O original é um clássico, e não se deveria tentar fazer melhor do que o gênio Serge Gainsbourg com uma versão mais leve, disco. Quando McLaren se arrisca a cantar, em "Jazz is Paris", é quase um alívio. Esta canção tem claras referências jazzísticas e é uma das mais comerciais do álbum.
"Club le Narcisse" poderia ser um sucesso nas pistas de dança, com "grooves" pesados tipo James Bond misturados com sons árabes. É bom ver que McLaren não perdeu sua visão da "world music" no sentido real do termo, que começou a desenvolver nos anos 80 com seus projetos solo, Duck Rock, Buffalo Girls e Fans, quando misturou "hip-hop" com música dos Apalaches, quadrilha e ópera. E tudo isso antes mesmo de artistas como Paul Simon e Peter Gabriel.
Falta, porém, em "Paris" a mesma ousadia desses projetos passados, mas, como qualquer coisa que emerge da cabeça de McLaren, não deve ser ignorado. Os anos parecem ter suavizado McLaren e, com "Paris", nos vemos diante de um produto muito mais sofisticado.
É difícil não esperar mais de McLaren, um visionário tão incrível da cultura pop. Talvez ele não tenha nascido para ser o astro, mas a eminência parda maquiavélica que fica nos bastidores. Em todo caso, esperemos que McLaren não demore a encontrar um novo alvo.

Tradução de Clara Allain

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