São Paulo, sábado, 25 de novembro de 1995
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Mar de dúvidas

EDUARDO MATARAZZO SUPLICY

Na sessão extraordinária realizada na noite de 21 de dezembro de 1994 alertei, junto com o senador José Paulo Bisol, que o Senado não poderia votar em regime de urgência os projetos que autorizavam o governo brasileiro a contratar financiamento externo no valor de US$ 1,7 bilhão para a implantação do Projeto Sivam. Por não haver nenhuma ameaça à Segurança Nacional era dever do Senado Federal analisar em profundidade o projeto do Executivo.
Seria o Projeto Sivam, da forma como estava apresentado, a melhor maneira de impulsionar o desenvolvimento da Amazônia, de seus habitantes e ao mesmo tempo a melhor proteção para o espaço terrestre e aéreo da região? Seria realmente necessário o dispêndio de US$ 2,8 bilhões nos próximos 19 anos, seria a melhor forma de protegermos nosso território contra narcotraficantes?
Temos conhecimento de inúmeras alternativas que podem mais diretamente melhorar a qualidade de vida do povo da Amazônia.
Sob a alegação de segurança nacional e com autorização do próprio Conselho de Segurança Nacional, o governo brasileiro preferiu não utilizar processo de licitação pública para o Sivam. Em vez disso realizou uma seleção na qual as informações e convites foram encaminhados para 16 embaixadas de países amigos, que ficaram de contatar empresas capacitadas para realizar o projeto. O que se pode revelar a 16 países e suas empresas obviamente poderia constar de edital público sem prejuízo para a segurança nacional.
Outra indagação: quais as razões da escolha da Esca, considerada pelo governo como única empresa no Brasil capaz de realizar o trabalho de integradora do sistema e ajudar no próprio processo de escolha do consórcio vencedor, liderado pela Raytheon? O fato de a Esca ter sido afastada do projeto por haver falsificado documentos e de o governo ter assumido junto à Raytheon o trabalho de integração já constitui prova suficiente de que havia as alternativas para a escolha da integradora.
Há dúvidas de que a tecnologia escolhida também não era a melhor para os propósitos do projeto Sivam. À época o relator, usando de documentos fornecidos pelo governo, defendeu os procedimentos que a Raytheon iria empregar como sendo os mais avançados disponíveis no mercado. Declarou inclusive que a tecnologia "Over the Horizon", por mim citada, encontrava-se em fase de pesquisa. Para meu espanto, na última terça-feira o relator afirmou que essa mesma tecnologia é a melhor para ser empregada no Sivam.
Nesta semana o relator apresentou projeto de resolução semelhante ao que eu, juntamente com outros 19 senadores, encaminhei no primeiro semestre propondo o cancelamento das autorizações aprovadas em 21/12/94. O relator está consciente das razões pelas quais aquele projeto não deveria ter sido aprovado pelo Senado naquela noite.
Até porque incluiu nas resoluções aprovadas artigos que não constavam da solicitação original do Executivo, destinando US$ 250 milhões à Esca. Valor bem superior ao que a coordenação do Projeto Sivam inicialmente lhe havia reservado. Por essas razões fica difícil a defesa do projeto sem que haja uma nova licitação.

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