São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995
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Foi Graziano quem mandou fazer 'grampo'

JOSIAS DE SOUZA; RUI NOGUEIRA

É falsa versão difundida pelo presidente do Incra e por seu assessor de que foi apenas avisado sobre operação
JOSIAS DE SOUZA
Diretor-executivo da Sucursal de Brasília
RUI NOGUEIRA
Coordenador de Produção da Sucursal de Brasília
Foi Francisco Graziano, presidente do Incra, quem encomendou a instalação de escuta no telefone do embaixador Júlio César Gomes dos Santos, ex-chefe do cerimonial da Presidência. A Folha apurou junto à Polícia Federal que Graziano solicitou o grampo por intermédio de Paulo Chelotti, seu assessor.
É falsa a versão, difundida pelo próprio Graziano e por Paulo Chelotti, em nota à imprensa, de que só soube do grampo no último dia 9 de novembro. Ele sempre esteve por trás do caso.
Graziano continuava negando ontem qualquer envolvimento com o episódio do grampo. Anteontem, o próprio presidente Fernando Henrique saiu em sua defesa.
Disse que não havia qualquer prova definitiva. Nada que justificasse, por enquanto, o seu afastamento. Ontem, no intervalo da reunião ministerial que o presidente promovia para fazer uma avaliação do governo, o porta-voz Sérgio Amaral disse que o Sivam não fez parte da pauta: "Não há nenhum elemento novo", resumiu.
Conhecido como "Chelottinho", o auxiliar de Graziano que pediu a escuta é irmão do diretor da Polícia Federal, Vicente Chelotti. Na campanha presidencial, trabalhou como segurança de Fernando Henrique.
Graziano e "Chelottinho" integram um grupo que, desde a campanha, vigiava os passos do embaixador Júlio César Gomes dos Santos, afastado do cerimonial do Planalto depois que, graças à escuta, revelaram-se suspeitas de que traficava influência no terceiro andar do Planalto, em sala vizinha ao gabinete presidencial.
Os demais integrantes do grupo são Augusto Fonseca, atual assessor de imprensa de Graziano, e seu sócio Mino Pedrosa, repórter fotográfico. Fonseca e Pedrosa são proprietários da agência de notícias "Free-Press", que prestou serviços ao comitê de campanha do candidado Fernando Henrique. Fonseca disse que seu destligamento da direção da empresa está em processo na Junta Comercial.
Foi mesmo Mino Pedrosa, como ele próprio reconheceu na semana passada, quem vazou o relatório confidencial da PF com a transcrição dos diálogos de Júlio César para a revista "IstoÉ".
No mesmo dia em que revelou sua condição de "fonte", Mino disse ter recebido a transcrição das fitas de contatos que mantém na polícia. E declarou que, após entregar a papelada à revista, deu-a também a Graziano.
Graziano, porém, teve de desmontar a versão providencial do amigo. Em entrevista concedida na véspera, o ministro da Justiça, Nelson Jobim, dissera que FHC recebeu as transcrições de Graziano no dia 9 de novembro -antes, portanto, que os documentos chegassem à imprensa.
Em sua nota oficial de sexta-feira, Graziano reconhece ter levado os papéis ao presidente no dia 9. E diz ter recebido o documento de "Chelottinho".
Conforme a apuração da Folha, "Chelottinho" entendeu-se diretamente com o delegado Mário José de Oliveira Santos, afastado na última quinta-feira da chefia do Centro de Dados Operacionais da Polícia Federal.
Em diálogo com seus amigos na PF, o delegado confidenciou, na semana passada, que agiu imaginando que prestava um serviço sob encomenda da Presidência da República. Oliveira Santos tomou a iniciativa de pedir o seu afastamento da chefia do Centro de Dados Operacionais.
No instante em que a escuta foi tramada, em agosto passado, não se imaginou que Júlio César seria pilhado em conversa tão comprometedora como a que manteve com o dono da Líder Táxi Aéreo, José Afonso Assumpção, representante da Raytheon no Brasil.
Graziano e seus auxiliares suspeitavam que o diplomata trocasse pequenos favores com empresários. Mas não esperavam envolvê-lo na concorrência do Sivam, o sistema de radares que o governo planeja instalar na Amazônia.
A despeito dos reiterados desmentidos de Graziano, a cúpula do Ministério da Justiça, incluindo o ministro Nelson Jobim, mantém as suspeitas de envolvimento do presidente do Incra.
Mas será difícil provar cabalmente, como deseja FHC, que Graziano tomou parte da trama que resultou na escuta. Ele está protegido pela ausência de documentos.

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