São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995
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Técnico Luiz Felipe já pensa no futuro

ANDRÉ FONTENELLE
DA REPORTAGEM LOCAL

Luiz Felipe Scolari, 47, levou dois anos para alcançar prestígio nacional como técnico do Grêmio.
Neste ano, conquistou os títulos do Estadual gaúcho e da Libertadores da América e foi vice-campeão da Copa do Brasil.
Agora, com o time na final do Mundial interclubes, contra o Ajax, na manhã de terça (hora de Brasília), o treinador-revelação de 95 já pensa em novos objetivos.
Embora, no início deste mês, tenha renovado contrato até o final do próximo ano, ele não descarta propostas de outros grandes clubes do país, que lhe ofereçam um bom contrato de dois ou três anos.
Enquanto isso não ocorre, já pensa na próxima tarefa à sua frente, qualquer que seja o resultado da decisão de Tóquio: reformular o time, que vai se desmantelar com a saída de vários jogadores.
Antes da decisão, procura tirar proveito da condição de "azarão" da final. Mas não descuida de detalhes, como esconder dos holandeses as jogadas que prepara para a partida, como explica nesta entrevista por telefone, de Tóquio.

Folha - Ao assumir o Grêmio, em 93, o sr. imaginava chegar tão rapidamente aonde chegou?
Luiz Felipe Scolari - Não, porque em 93 nós começamos no meio do ano e no final da temporada tínhamos ido muito mal. A equipe tinha feito 30 contratações de jogadores experientes, já bem mais idosos, e nada.
Em 94, mudamos a filosofia de trabalho e começamos ganhando a Copa do Brasil. Aos pouquinhos, a equipe foi engrenando, culminando com este ano. Ninguém pensava em chegar à final da Libertadores.
Folha - A temporada foi estafante para o Grêmio. Qual é o estado do time?
Luiz Felipe - Muito bom, porque nós antecipamos aqueles jogos do Campeonato Nacional e ficamos uma semana em Canela (RS), na serra, nos recuperando e fazendo um trabalho específico para este jogo. Sabíamos que não tínhamos condição de ganhar nada no Nacional e que íamos nos preparar para este jogo aqui.
Folha - Qual foi o melhor momento da temporada? E o pior?
Luiz Felipe - O melhor foi em julho, quando tivemos condições de nos preparar para a final da Libertadores (vitória sobre o Nacional de Medellín, da Colômbia). E o pior foi antes da final da Copa do Brasil (derrota para o Corinthians, em junho), quando jogamos 7 jogos em 15 dias e metade do time estava machucada.
Folha - Há quem defina o jogo contra o Ajax como o confronto entre um europeu que joga à sul-americana e um sul-americano que joga à européia. Como o sr. define a partida?
Luiz Felipe - (Ri) Essa definição é boa, viu? Está certa. Somos sul-americanos e jogamos num estilo mais europeu, mais forte. E o estilo do Ajax é mais de ataque.
Se bem que me parece que o Ajax tem uma coisa planejada. É quase mecânico. Não tem jogadas individuais para decidir uma partida. É um time de aspecto sul-americano, mas organizado taticamente com a cultura européia, o que é muito difícil.
Folha - O sr. é visto como um técnico que arma boas equipes sem grandes estrelas. Concorda com essa definição?
Luiz Felipe - Se tu não tens dinheiro para contratar, tens que te virar com o que tens, não é? Tem que fazer aquele grupo de trabalho entender que, para ganhar, é preciso ter uma organização, um sentido tático, um posicionamento correto.
Aí o time se iguala com equipes que têm jogadores mais qualificados -porque hoje, no futebol, alguns deles não têm muita vontade de correr.
Folha - Qual é o seu futuro profissional após a decisão?
Luiz Felipe - Em princípio, eu renovei meu contrato com o Grêmio. E... não sei, não é por ter renovado o contrato que eu vou dizer que vou ficar. Para eu sair do Grêmio agora, teria que receber uma proposta com muita vantagem financeira e um contrato de dois a três anos. Senão, eu não saio do Grêmio, não.
Folha - O sr. esteve entre os nomes cogitados para substituir Carlos Alberto Silva, no Palmeiras. Pensa em treinar clubes do Rio ou de São Paulo?
Luiz Felipe - Penso. Acho que o sonho de qualquer técnico, principalmente do Sul, é atingir o centro do país, São Paulo e Rio. Hoje, o melhor campeonato do Brasil é disputado em São Paulo.
As equipes de São Paulo dão condições melhores de trabalho, no aspecto de contratações. Eu penso, mas não sei se é o momento ainda. Vou continuar fazendo esse trabalho no Grêmio e, se for o caso, quem sabe no ano que vem.
Folha - Muitos jogadores do Grêmio vão se transferir. Qual é o futuro do time?
Luiz Felipe - Vou trocar. Fazer o quê? Aqueles que foram vendidos -dois, três, quatro ou cinco- e mais alguns que estavam emprestados ou com passe livre.
Vamos fazer uma reformulação no plantel, de novo. Um auxiliar já está assistindo a muitos jogos do Campeonato Nacional em locais diferentes, com nomes de jogadores que a gente passa para ele, para ver se só jogam bem contra nós, se jogam dentro da nossa filosofia. Vamos fazer outro time.
Folha - Agrada ao sr. a posição de "azarão" contra o Ajax?
Luiz Felipe - Agrada plenamente. É o que eu mais pedi a Deus. Não quero ser favorito de nada, porque aí você entra com compromisso. O "azarão", com a equipe que tem, vai trabalhar sério... Não sei se vai dar o azarão, viu?
Folha - O volante Dinho e o atacante Jardel, que estão contundidos, preocupam?
Luiz Felipe - Preocupam, mas são o tipo de jogador que pode ter alguma dorzinha, mas joga, se supera, pois são dois jogadores que mostraram um caráter maravilhoso. Confio plenamente em que eles possam jogar.
Folha - O sr. interrompeu um treino para expulsar um cinegrafista holandês. Está preocupado com espionagem?
Luiz Felipe - Não é problema de espionagem. O problema é o seguinte: o cara sobe com uma câmera de televisão lá em cima de um palanque de 10 m de altura.
Estou fazendo um treinamento tático em que paro a jogada para mostrar cobertura, um monte de coisas. Não posso dar uma de anjinho para o Ajax, que proíbe a entrada de brasileiros no treino dele.
Bonzinho, até certo ponto. Ingênuo e burro, aí não, né? Vai focalizar a pelada de dois toques, cruzamento, esse tipo de coisa que não vai dar nada. Agora, pênalti e jogada ensaiada, eu não vou deixar filmar.

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