São Paulo, segunda-feira, 4 de dezembro de 1995
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Criacionista 'prega' em universidade

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Até ontem ele podia ser encontrado em um templo batista em São Paulo, pregando sua visão da origem do Universo e da vida.
Mas, entre uma e outra visita aos fiéis, teve tempo de pregar ao inimigo: biólogos evolucionistas que acreditam que o homem feito "à imagem e semelhança de Deus" possa ter evoluído de outras formas de vida, "primitivas".
Ele é Duane T. Gish, vice-presidente sênior do Instituto para Pesquisa em Criação, da Califórnia, EUA. Ele se dedica agora a tentar destruir a teoria da evolução, que julga incompatível com suas convicções religiosas. O seu instituto tem dez pesquisadores.
Gish fez palestras na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e na USP (Universidade de São Paulo). Autodefinido como "criacionista científico", ele viaja muito em defesa de seu ponto de vista. Já foi a 49 dos 50 estados americanos e a quase 30 países.
Sua palestra na USP estava marcada para as 10h na última sexta-feira. Começou meia hora depois, numa tentativa de engrossar as fileiras da platéia.
Menos de 20 pessoas, a maioria estudantes, começaram a ouvir o sujeito que pretendia, segundo os cartazes, provar pela ciência a existência de deus. Até o final, chegaram curiosos, até quase dobrar a audiência lá pelo meio-dia.
Gish foi bioquímico. Trabalhou tanto na universidade como na indústria farmacêutica. Mas procurou dados em outras disciplinas científicas para atacar a evolução, fato aceito pela ciência e explicado por teorias como a darwinista.
Começou criticando a teoria cosmológica do "big bang -segundo a qual o Universo teria começado em uma grande explosão. Ele a considera uma fantasia e fez uma piada -"para explicar esse ovo cósmico, faltaria uma galinha cósmica"- que provocou umas poucas risadas encabuladas.
"A vida não pode ter surgido naturalmente. Só existe outra opção: foi criada sobrenaturalmente", resumiu.
Mas, em vez de mostrar como isso pode ter acontecido, juntou argumentos contra a evolução -alguns aparentemente válidos, como a "inexistência" de formas transicionais no registro fóssil (não é verdade que não existam, e o fato de existirem poucas é explicado por teorias de especiação e fenômenos de extinção em massa). Outros não são argumentos, como relatar fraudes, que obviamente não são o que a ciência afirma.
Gish já teve a duvidosa honra de ser citado pelo evolucionista Stephen Jay Gould.
Para Gish, não é possível conhecer pela ciência como o criador fez sua obra e está escrito na Bíblia que deus sempre existiu. Ele diz que faz ciência, não religião. Pergunta Gould: por que então criacionismo "científico"?

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