São Paulo, quinta-feira, 7 de dezembro de 1995 |
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Um Drummond sem versos
JOSIAS DE SOUZA BRASÍLIA - Soube por Nelson Rodrigues de um caso interessante. Carlos Drummond de Andrade precisou oferecer um livro ao romancista Marques Rebelo. E anotou na dedicatória: "A Marques Rebelo -sem palavras".Nelson interpretou o episódio à sua maneira: "Ao que eu saiba, poesia é uma arte de palavras. E, se um poeta não as tem, poderemos talvez chamá-lo de antipoeta". Ontem, Fernando Henrique foi chamado a tomar uma decisão. Após uma semana de suspense, reuniu o Conselho de Defesa Nacional para definir o que fazer com o Sivam. Poderia manter o processo de compra de radares ou cancelá-lo, abrindo nova licitação. Achou melhor deixar tudo como estava. A essa altura, o leitor deve estar perguntando a seus botões por que diabos misturo Nelson e Drummond com sua excelência. Abro aqui um parêntese explicativo: assim como a poesia não existe sem a palavra, também não há presidência sem decisão. E arremato à Nelson: se um presidente não toma decisões, podemos chamá-lo de antipresidente. Fernando Henrique como que lavou as mãos. "Ouvido o Conselho (de Defesa Nacional), o presidente resolveu aguardar o pronunciamento do Senado", diz a nota distribuída no Planalto. Levantou-se uma bola açucarada para ACM, presidente da supercomissão montada para dissecar o cadáver do Sivam. Anteciparam-lhe o Natal. O senador não pediria melhor presente a Papai Noel. No caso de Drummond, havia um motivo bem mineiro para a economia de vocábulos. O poeta não desejava elogiar o romancista. E valeu-se do truque do "sem palavras. Com o presidente, o caso é outro. Imaginou-se tudo. Menos que pudesse dar meia-volta às margens do Rubicão. O bom senso recomenda a anulação do contrato com a Raytheon. Se adotasse esse caminho, o governo espantaria, desde já, o fantasma da dúvida. Para dizer o mínimo. O presidente pensa diferente. À noite, mandou dizer que não enxerga razões objetivas para anular o contrato. Ora, nesse caso não precisaria ter convocado o Conselho. Bastaria tê-lo mantido. Texto Anterior: O Estado caixa-preta Próximo Texto: Os não-suicidas Índice |
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