São Paulo, segunda-feira, 11 de dezembro de 1995
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Os deuses interferiram no Pacaembu

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A lógica mandava que o Santos entrasse em campo com Camanducaia pela ponta-direita, Macedo pelo meio e Marcelo Passos na esquerda. Mas em que lógica poderia se apoiar o técnico Cabralzinho num jogo em que o seu time deveria não só ganhar do Flu, mas pontuar uma diferença de três gols?
Só mesmo a lógica muito particular do treinador de olho esperto, que anteviu o caminho para a vitória do lado direito da defesa tricolor, enfiando por ali o veloz e hábil Camanducaia. E não deu outra: Camanducaia partiu sobre Ronald, livrou-se de seu marcador e sofreu o pênalti que Giovanni converteu.
Mas não é só de lances estratégicos que se faz um vencedor. No centro, sempre estará o craque. E, durante o primeiro tempo, a vitória esteve nos pés dos craques. Primeiro, Renato Gaúcho, que desperdiçou. Depois, nos de Giovanni, que fez o segundo também, numa vertiginosa tabelinha com Marcelo Passos, como nos bons tempos de Pelé.
A propósito, nem Pelé, que eu me lembre, arriscou um lance desses: antes do jogo, ao microfone do Tatá Muniz, da Band, Giovanni, simplesmente, assegurou que faria dois gols. E fez.
Ah, sim: antes de terminar o primeiro tempo, o Santos ainda meteu uma bola na trave, com Macedo, e teve o milagre do terceiro gol nos pés de Camanducaia.
E o milagre veio no segundo tempo, na mais emocionante decisão dos últimos anos. Se é que se possa chamar de milagre essa inexplicável combinação de cromossomos, circunstâncias e acasos que determina o nascimento de um craque. Pois um passe simples na execução, mas altamente sofisticado na percepção, de Giovanni para Macedo, resultou no terceiro gol.
Assim como uma arrancada do mesmo Giovanni pela direita deu o quarto gol a Camanducaia.
E, por fim, o toque de calcanhar que deixou Marcelo Passos em condições de executar a obra dos deuses.
Sim, porque o que aconteceu ontem à noite no Pacaembu foi uma interferência deles, provavelmente indignados com a trama espúria de desclassificar esse Santos exatamente na hora da celebração a um futebol ofensivo, alegre, leve, surpreendente, que redime o próprio futebol.
E um crime de lesa-majestade ao novo Rei da Vila: Giovanni.

Tudo bem. O Cruzeiro foi heróico, jogando praticamente o segundo tempo todo com dez jogadores contra onze do Botafogo, dominou a bola e os espaços a maior parte do tempo, perdeu duas ou três chances de ouro, meteu uma bola na trave e teve o craque da partida na figura do menino Serginho, que entrou e arrebentou.
Mas foi o Botafogo que teve o gol a seus pés por sete vezes -em três, a bola bateu na trave; as demais foram conjuradas pelo goleiro Dida. Logo, não se pode dizer que foi um resultado injusto para o Cruzeiro esse empate de 0 a 0 no Maracanã, ontem à tarde, que acabou classificando o Botafogo para a decisão do título brasileiro deste ano.
Mais que isso: se houve um time que mereceu chegar lá, esse foi, durante os dois turnos, o Botafogo, o que cumpriu a campanha mais equilibrada ao longo de todo o torneio.

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